São Paulo, 17 de dezembro de 2024 – O Comitê de Política Monetária (Copom) avaliou que houve uma deterioração adicional no cenário de inflação, como refletido nas expectativas e projeções de inflação. A informação faz parte da ata da mais recente reunião do Copom, realizada nos dias 10 e 11 de dezembro.
“Concluiu-se que os determinantes de prazo mais curto, como a taxa de câmbio e a inflação corrente, e os determinantes de médio prazo, como o hiato do produto e as expectativas de inflação, se deterioraram de forma relevante”, explica a ata. “Tal piora demanda uma política monetária ainda mais contracionista”.
O Comitê então decidiu, unanimemente, pela elevação de 1,00 ponto percentual na taxa Selic e pela comunicação de que, em se confirmando o cenário esperado, antevê ajuste de mesma magnitude nas próximas duas reuniões. Na discussão que embasou tal deliberação duas dimensões foram bastante discutidas.
Em primeiro lugar, a magnitude da deterioração de curto e médio prazo do cenário de inflação exigia uma postura mais tempestiva para manter o firme compromisso de convergência da inflação à meta.
Em segundo, vários riscos se materializaram tornando o cenário mais adverso, mas menos incerto, permitindo maior visibilidade para que o Comitê oferecesse uma indicação de como antevia as próximas decisões.
“A magnitude total do ciclo de aperto monetário será ditada pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta e dependerá da evolução da dinâmica da inflação, em especial dos componentes mais sensíveis à atividade econômica e à política monetária, das projeções de inflação, das expectativas de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos”, completa.
Em função da materialização de riscos, o Comitê avalia que o cenário se mostra menos incerto e mais adverso do que na reunião anterior. Riscos à alta da inflação, tais como a resiliência da inflação de serviços, a desancoragem das expectativas e a depreciação cambial se materializaram. “Assim, um cenário que até então se mostrava bastante incerto tornou-se mais adverso”.
Taxa Neutra
O Comitê debateu as estimativas sobre a taxa neutra de juros que seriam utilizadas como hipótese para as projeções. A taxa neutra é uma variável não observável, sujeita a grande incerteza na estimação. Em função da incerteza intrínseca e da própria natureza da variável, o Comitê reforçou que a taxa neutra não é uma variável que deve ser atualizada em frequência alta e que tampouco deveria ter movimentos abruptos, salvo em casos excepcionais. Nesse contexto, o Comitê elevou a taxa de juros real neutra em seus modelos de 4,75% para 5,00% a.a. e seguirá avaliando essa hipótese.
Inflação
O cenário prospectivo de inflação mostra-se mais desafiador em diversas dimensões. O Comitê analisou inicialmente a atividade econômica, a demanda agregada, as expectativas de inflação, a inflação corrente e o cenário internacional. Em seguida, discutiu as projeções e expectativas de inflação para então deliberar sobre a decisão corrente e comunicação futura.
Analisando o período corrente de atividade econômica, persiste um cenário de atividade resiliente com dinamismo maior do que esperado, como evidenciado na divulgação do PIB do terceiro trimestre, levando a nova reavaliação de um hiato mais positivo. O mercado de trabalho também segue aquecido, com aumento da população ocupada, queda da taxa de desemprego e aumento da formalização de postos. Observa-se, no entanto, alguma moderação no ritmo de crescimento de salários nas diferentes pesquisas, mas ainda em níveis elevados.
“A conjunção de um mercado de trabalho robusto, política fiscal expansionista e vigor nas concessões de crédito amplo segue indicando um suporte ao consumo e consequentemente à demanda agregada”, completa a ata.
No entanto, para a atividade futura, há elementos que sugerem uma desaceleração, tal como o maior aperto das condições financeiras. De todo modo, o Comitê ressalta que a economia tem surpreendido e apresentado notável resiliência. O Comitê acompanhará tal processo, entendendo que a redução do hiato previsto em suas projeções é inerente ao funcionamento ordenado dos mecanismos de transmissão e ao atingimento da meta de inflação.
“Além da incerteza sobre o processo da desaceleração, persiste o debate se a desaceleração prevista se daria por uma restrição dos fatores de produção ou por uma queda de demanda, com impactos muito distintos sobre o processo inflacionário”.
O cenário de inflação de curto prazo se deteriorou. “Os preços de alimentos se elevaram de forma significativa, em função, dentre outros fatores, da estiagem observada ao longo do ano e da elevação de preços de carnes, também afetada pelo ciclo do boi”.
Persiste, no entanto, uma assimetria altista no balanço de riscos para os cenários prospectivos para a inflação. Entre os riscos de alta para o cenário inflacionário e as expectativas de inflação, destacam-se (i) uma desancoragem das expectativas de inflação por período mais prolongado; (ii) uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais positivo; e (iii) uma conjunção de políticas econômicas externa e interna que tenham impacto inflacionário, por exemplo, por meio de uma taxa de câmbio persistentemente mais depreciada. Entre os riscos de baixa, ressaltam-se (i) uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada; e (ii) os impactos do aperto monetário sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o esperado.
Câmbio
As condições financeiras e a taxa de câmbio passaram por forte alteração no período mais recente. A conjunção de uma taxa de câmbio mais depreciada com a elevação das curvas de juros nominal e real torna o ambiente mais complexo. Lembrou-se que o repasse do câmbio para os preços aumenta quando a demanda está mais forte, as expectativas estão desancoradas ou o movimento cambial é considerado mais persistente. Desse modo, o Comitê deve acompanhar de forma mais detida como se dará a transmissão da taxa de câmbio e das condições financeiras para preços e atividade.
Com relação à política econômica de forma mais geral, o Comitê manteve a firme convicção de que as políticas devem ser previsíveis, críveis e anticíclicas. Em particular, desacelerações são parte essencial do processo de suavização e reequilíbrio da economia. O debate do Comitê evidenciou, novamente, a necessidade de políticas fiscal e monetária harmoniosas.
Fiscal
A percepção dos agentes econômicos sobre o recente anúncio fiscal afetou, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco, as expectativas de inflação e a taxa de câmbio. De fato, as expectativas de inflação, medidas por diferentes instrumentos e obtidas de diferentes grupos de agentes, elevaram-se em todos os prazos, indicando desancoragem adicional. Nota-se que tanto o prêmio de inflação extraído dos instrumentos financeiros quanto as expectativas de inflação se elevaram no período, tornando o cenário de inflação mais adverso e requerendo uma política monetária mais contracionista. A desancoragem das expectativas de inflação é um fator de desconforto comum a todos os membros do Comitê e deve ser combatida.
Inflação
O Comitê reforçou a visão de que o esmorecimento no esforço de reformas estruturais e disciplina fiscal, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre o custo de desinflação em termos de atividade.
Cenário externo
O cenário externo se mantém desafiador, com incertezas econômicas e geopolíticas relevantes. Com relação aos Estados Unidos, permanece a incerteza sobre o ritmo da desinflação e da desaceleração da atividade econômica. Em paralelo, a possibilidade de mudanças na condução da política econômica também traz adicional incerteza ao cenário, particularmente com possíveis estímulos fiscais, restrições na oferta de trabalho e introdução de tarifas à importação.
O cenário-base do Comitê segue sendo de desaceleração gradual e ordenada da economia norte-americana. O Comitê reforçou que o compromisso dos bancos centrais com o atingimento das metas é um ingrediente fundamental no processo desinflacionário, corroborado pelas recentes indicações de ciclos cautelosos de distensão monetária em vários países. Como usual, o Comitê focará nos mecanismos de transmissão da conjuntura externa sobre a dinâmica inflacionária interna e seu impacto sobre o cenário prospectivo. Reforçou-se, ademais, que um cenário de maior incerteza global e de movimentos cambiais mais abruptos exige maior cautela na condução da política monetária doméstica.
Dylan Della Pasqua / Agência Safras News
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