Combate à corrupção no Brasil está em risco, diz OCDE

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São Paulo – A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) considera que o combate à corrupção no Brasil corre o risco de sofrer retrocessos, principalmente por causa de limites ao uso de informações financeiras em investigações e à atuação de juízes e promotores.

“Apesar de o país ter sido reconhecido pelo Grupo de Trabalho por seus significativos esforços no combate à corrupção após sua avaliação anterior, em 2014, há agora preocupações de que o Brasil, devido às recentes ações tomadas pelos Poderes Legislativo e Judiciário, corra o risco de retroceder nos progressos feitos”, disse a OCDE em comunicado.

Segundo o grupo, o Brasil vem sendo alertado pela organização desde 2016 sobre os potenciais riscos de ampliar a definição sobre o que constituiria abuso de autoridade por parte de juízes e promotores, mas mesmo assim uma lei sobre este assunto (13.869/2019), “caracterizada por conceitos vagos”, entrará em vigor no início de 2020.

A OCDE também demonstrou receio com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, de suspender processos baseados em dados fiscais e bancários compartilhados com promotores sem autorização judicial.

“O Grupo de Trabalho também manifestou preocupações de que, na sequência de decisões liminares do Supremo Tribunal, as limitações à utilização de relatórios da Unidade de Inteligência Financeira, da Receita Federal e de outros órgãos administrativos em investigações criminais possam prejudicar seriamente a capacidade do Brasil em detectar e combater de maneira eficaz a corrupção”, disse a OCDE.

Toffoli determinou a suspensão nacional de todos os processos judiciais que envolvam compartilhamento, sem autorização judicial e para fins penais, de dados fiscais e bancários de contribuintes – ou seja, dados obtidos via Receita Federal, Banco Central (BC) e o antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), transformado na Unidade de Inteligência Financeira (UIF) do BC.

A decisão beneficiou diretamente o filho do presidente Jair Bolsonaro, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ). Ele vinha sendo investigado desde 2018 após dados coletados pelo antigo Coaf e enviados ao Ministério Público do Rio de Janeiro apontarem movimentações financeiras suspeitas de vários funcionários da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).

Um destes funcionários era Fabricio Queiroz, assessor de Flávio na época em que ele ocupava o cargo de deputado estadual. Informações vazadas à imprensa mostraram que também havia movimentações suspeitas nas contas do político.

Em janeiro deste ano, Flávio chegou a reclamar ao STF do fato de não ter havido autorização judicial para o compartilhamento de seus dados com os promotores e solicitou decisão que considerasse as provas contra ele ilegais. Em fevereiro, o ministro Marco Aurélio rejeitou o pedido.

A decisão de Toffoli deve ficar em vigor pelo menos até a semana que vem, está agendado, na pauta do STF, o julgamento do Recurso Extraordinário 1055941.

Gustavo Nicoletta / Agência CMA (g.nicoletta@cma.com.br)