Brasil pode ser forçado a buscar mercados após acordo entre EUA e China

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Por Caroline Aragaki

São Paulo – O Brasil pode ser forçado a buscar novos mercados para seus produtos agrícolas, em especial a soja, após o acordo comercial de primeira fase fechado entre Estados Unidos e China na sexta-feira, que prevê que Pequim aumente as compras de produtos agrícolas norte-americanos em pelo menos US$ 40 bilhões.

“O acordo pode levar a uma perda de mercado para o Brasil, com uma queda na exportação que pode ser de até 50%, caso os chineses voltem a importar a soja norte-americana”, afirmou o professor de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Alexandre Uehara.

Segundo ele, “o Brasil agora tem a tarefa de aumentar a competitividade para conquistar novos mercados”. Comparando com outros exportadores, o Brasil está entre as dez maiores economias do mundo, mas no comércio mundial está na 27 posição de exportadores e tem muito espaço para ampliar.

Outro impacto que pode ocorrer diz respeito à compra de carnes pela China, que sofreu com gripe suína e, consequentemente, desenvolveu um mercado de carne bovina.

“Não necessariamente esse mercado bovino será nosso para sempre, não é uma certeza”, disse o professor da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP) Vinicius Rodrigues Vieira.

Segundo Uehara, da ESPM, caso a China volte a investir na produção interna de suínos, “a demanda por soja em grãos para ração para porcos pode ser mantida ou até ampliada em função da constituição”.

De acordo com os termos do pacto de primeira fase entre Estados Unidos e China, Pequim deve comprar ao menos US$ 40 bilhões em itens agrícolas norte-americanos. Além disso, os chineses evitarão desvalorizações competitivas do iuane e apertarão regras de propriedade intelectual e transferência de tecnologia.

Em troca, os Estados Unidos manterão tarifas de 25% sobre aproximadamente US$ 250 bilhões em importações chinesas e reduzirão de 15% para 7,5% as tarifas sobre US$ 120 bilhões em bens chineses.

No auge da guerra comercial entre as duas maiores economias do mundo, o Brasil foi beneficiado com um ganho extraordinário por conta da transferência de compra de produtos norte-americanos para produtos brasileiros.

“Com a primeira fase do acordo, a tendência é que haja um retorno da situação inicial de 2017”, disse o docente de Ciências Políticas e Econômicas da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), Luís Antonio Paulino. “Não era uma situação ruim, já que naquela época estávamos exportando muito em termos do agronegócio”, acrescentou.

A China é o principal destino das exportações brasileiras, com 27,8%, segundo o Indicador de Comércio Exterior (Icomex), da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de novembro.

“A China se tornou o principal destino das exportações agrícolas brasileiras e não vejo esse cenário se alterar, até por conta do grande mercado consumidor e do poder de compra. Nós temos uma China com uma classe média de 300 milhões de pessoas, o que equivale aos Estados Unidos e metade da União Europeia”, afirmou Vieira, professor da FAAP.

Quanto a isso, “o Brasil é um parceiro estratégico e de longo prazo para a China, e o governo chinês não está interessado em causar ruído nessa relação em troca de um acordo comercial com os Estados Unidos”, afirmou Paulino, professor da Unesp.

Ele cita que,no início do ano, mesmo com os confrontos de plano político a partir da posse de Jair Bolsonaro como presidente brasileiro, os chineses mantiveram em uma posição cautelosa para não acirrar nenhum tipo de disputa.

O cônsul-geral da China no Rio de Janeiro, Li Yang, acredita que a negociação entre Pequim e Washington não terá relação com o Brasil.

“Tenho toda a confiança no relacionamento entre Brasil e China em todas as áreas”, afirmou depois de participar do seminário O Futuro da Parceria Estratégica Global China-Brasil, na Fundação Getúlio Vargas (FGV), na sexta-feira.

A primeira fase do acordo inverte o papel de protecionismo chinês e liberalismo norte-americano, conforme explica Uehara: “De um lado temos o governo norte-americano tentando garantir o mercado chinês em produtos como soja e milho. Do outro, o governo chinês afirma que pode importar os produtos norte-americanos, mas quer fazer livre mercado e não necessariamente vai comprar apenas a soja norte-americana.”

Os Estados Unidos são o segundo maior comprador de produtos brasileiros, apontou o Indec-FGV de novembro. “O Brasil também se beneficiou com o desvio de comércio da China e aumentou exportações de insumos e alguns tipos de manufaturados para os Estados Unidos”, afirmou Paulino, da Unesp.

Com o acordo comercial, “a indústria brasileira, que poderia investir mais em manufaturados com destino aos norte-americanos, perderá a oportunidade por conta da alta competitividade chinesa”, disse Vieira, professor da FAAP.