Bolsa recua diante de receio de recessão global; dólar sobe a R$ 5,20

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São Paulo – Em mais um dia de pânico nos mercados em todo o mundo e de nervosismo em relação ao futuro da economia global, o Ibovespa fechou em queda de 10,34%, aos 66.894,95 pontos, no menor patamar de fechamento desde o dia 21 de agosto de 2017 (68.634,64 pontos). O pregão também contou com o sexto circuit breaker desde o início da pandemia do coronavírus, o mesmo número de vezes em que o mecanismo foi ativado durante a crise financeira mundial de 2008. O volume total negociado hoje foi muito elevado e chegou a R$ 58,8 bilhões.

Na mínima do dia o índice chegou a 63.546,74 pontos, caindo quase 15%. No entanto, o índice reduziu perdas e conseguiu evitar o segundo circuit breaker do dia, que seria acionado se superasse perdas de 15%, interrompendo negociações por 60 minutos.

Para o analista de investimentos do banco Daycoval, Enrico Cozzolino, as novas medidas anunciadas pelo governo podem ter ajudado o índice a reduzir as perdas no fim do dia. O ministro da economia, Paulo Guedes, disse que R$ 5 bilhões serão encaminhados para trabalhadores informais já no primeiro mês de um programa voltado para esses profissionais, além de reiterar que a decretação do estado de calamidade pública dá espaço fiscal para o governo tomar mais medidas e investir mais em saúde.

“O que talvez tenha segurado um pouco foram essas medidas, mas são movimento pontuais, o cenário mudou, é mesmo de crise, e os 66 mil pontos não devem ser o fundo do poço”, disse o analista.

O economista da Toro Investimentos, Pedro Nieman, estranhou que não houve um novo circuit breaker e acredita que o “mercado está muito irracional”. Além disso, destaca que alguns papéis sentiram medidas restritivas anunciadas, como o fechamento de shopping em São Paulo, o que impactou papéis do setor de varejo.

No exterior, as Bolsas norte-americanas também fecharam com fortes perdas depois de um circuit breaker e o índice Dow Jones fechou abaixo dos 20 mil pontos pela primeira vez desde fevereiro de 2017. Mesmo o pacote de mais de US$ 1 trilhão anunciado ontem pelo governo do país não foi suficiente para acalmar ânimos, com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, citando hoje que, em um pior cenário, a taxa de desemprego poderia subir para 20%.

Trump ainda disse que deve fazer um grande anúncio ligado à Food and Drug Adminitration (FDA, na sigla em inglês) – o equivalente ao departamento de saúde e serviços humanos do governo, que pode ser feito ainda hoje ou amanhã.

Entre as ações, as maiores perdas foram da Smiles (SMLS3 -37,80%), da CVC (CVCB3 -34,67%) e da Azul (AZUL4 -30,72%), mas as quedas foram fortes em todos os setores, com exceção dos papéis do Carrefour (CRFB3 3,48%), da Telefônica Brasil (VIVT4 0,73%) e do BB Seguridade (BBSE3 0,11%), que podem se beneficiar com a crise e um aumento de demanda com as pessoas evitando sair de casa.

Amanhã, além de continuar acompanhando o noticiário em torno da pandemia, investidores devem reagir à decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), que divulgará ainda hoje se vai cortar a Selic. A expectativa de que o Copom siga bancos centrais no exterior e corte os juros aumentaram, mas traz dúvida devido ao impacto que isso pode trazer ao câmbio, com o dólar em patamares nunca antes vistos.

Para o sócio da Criteria Investimentos, Vitor Miziara, o cenário está complicado e é difícil saber qual será o fundo do poço do Ibovespa, mas os próximos patamares importantes a serem atingidos para baixo estão nos 60,4 mil pontos e 56 mil pontos.

O dólar comercial fechou em forte alta de 3,97% no mercado à vista, cotado a R$ 5,2010 para venda, pela primeira vez acima deste valor e renovando mais uma vez a máxima de histórica de fechamento, além de engatar o terceiro pregão seguido acima de R$ 5,00. Em sessão de forte volatilidade, a moeda estrangeira acompanhou a forte aversão ao risco que prevaleceu no exterior em meio ao anúncio de medidas estimulativas dos Estados Unidos e do governo brasileiro para enfrentamento dos efeitos do novo coronavírus.

“O estresse continuou a dar o tom. Nem mesmo anúncios de estímulos econômicos e por mais que governos e Bancos Centrais tenham redobrado esforços para conter a crise sanitária global, o sinal é de esgotamento”, avalia o gerente de mesa de câmbio da Correparti, Guilherme Esquelbek.

O presidente norte-americano, Donald Trump, anunciou a lei de produção de defesa (DPA, na sigla em inglês), que permite que o governo agilize e expanda o suprimento de recursos para a indústria dos Estados Unidos para apoiar programas militares, de energia, espaço e segurança interna. Aqui, o presidente Jair Bolsonaro e ministros se reuniram para anunciar medidas.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que trabalhadores informais afetados com a queda da atividade econômica serão atendidos com R$ 5 bilhões sendo encaminhados para informais no primeiro mês da medida a fim de recursos para manutenção básica. O ministro ainda declarou que vai usar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) para suspender as metas de resultado primário deste ano e conseguir expandir o orçamento para adotar medidas de combate ao vírus. Medidas de auxílio ao setor de aviação civil também foram anunciadas.

Para o economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira, boa parte das medidas anunciadas pelo governo federal agradaram ao mercado. Mas o cenário contínuo de incertezas faz o dólar operar em uma “dinâmica diferente”, mais atrelado ao movimento do exterior.

Hoje, o DXY – índice do valor do dólar em relação a uma cesta de moedas estrangeiras – operou acima de 100 pontos pela primeira vez desde abril de 2017. As principais moedas de países emergentes operaram com fortes perdas frente ao dólar. Destaque para o rublo russo que se desvalorizou em mais de 7% e o peso mexicano que acumulou perdas acima de 4%.

O Banco Central interviu no câmbio com quatro operações sendo um leilão de linha após a abertura dos negócios, com a oferta de US$ 2,0 bilhões em operação anunciada ontem, e atuou inesperadamente por três vezes ao longo do dia com a oferta de US$ 2,0 bilhões com a venda de dólares no mercado à vista. Do total, US$ 860 milhões foram tomados.

O viés de volatilidade e a tendência de alta em meio ao forte cenário de incertezas seguem nos próximos dias, comentam analistas. Para o analista da Toro Investimentos, Pedro Nieman, o mercado já está operando de forma “irracional”.

Amanhã, o destaque será a reação à decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) no qual divulgará daqui a pouco o novo patamar da taxa de juros. Sem unanimidade, o mercado aposta em corte de 0,50 ponto percentual (pp). “Pelo menos. Também entrou no preço um possível corte de até 1,0 pp. Um corte de 0,25 pp ou até manutenção vai gerar um forte ruído. O tom do comunicado também deve ditar bastante a direção dos mercados”, diz o analista.