Bolsa cai e dólar sobe com crise política no Renda Brasil

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São Paulo – O Ibovespa fechou em queda de 1,45%, aos 100.627,33 pontos, após o presidente Jair Bolsonaro barrar a proposta que recebeu do programa Renda Brasil, que teve seu lançamento suspenso até que se defina mais detalhes do benefício. As declarações reforçam as notícias de que há impasses dentro do pacote que está sendo preparado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, aumentando especulações sobre uma possível saída do ministro e receio de aumento de gastos.

No entanto, após chegar a cair mais de 2% e perder os 100 mil pontos na mínima do dia, o índice reduziu a queda, com investidores dando o benefício da dúvida a Guedes e ao governo, em meio a informações de que o presidente dará mais mais três dias para Guedes apresentar uma nova proposta sobre Renda Brasil. O volume total negociado foi de R$ 29,5 bilhões.

“Cresceram os boatos de que Guedes pode pedir demissão, mas também não é a primeira vez que isso acontece. De qualquer forma, há sinais de uma falta de consenso sobre as medidas”, disse o analista de investimentos do banco Daycoval, Enrico Cozzolino. O analista lembra que quando ocorreu uma debandada na equipe econômica há algumas semanas o Ibovespa também recuou em meio a boatos sobre a saída de Guedes.

O analista da Necton Corretora, Gabriel Machado, concorda que as declarações de Bolsonaro hoje deram sinalizações negativas e destaca que uma possível demissão de Guedes poderia levar o Ibovespa a sofrer uma correção mais forte, principalmente, se significar o abandono da agenda liberal pelo governo. “Até o momento, o presidente buscava concordar com Guedes e preocupa até mais a saída dele do que o programa em si”, disse, embora destaque que também há o temor de rompimento do teto de gastos.

O presidente afirmou, em cerimônia da Usiminas em Minas Gerais, que a proposta apresentada a ele sobre o Renda Brasil não será enviada ao parlamento e que não tiraria dos pobres para “dar aos paupérrimos”. Uma possibilidade era acabar com o abono salarial para bancar o programa.  Além disso, Bolsonaro afirmou que o auxílio emergencial no valor de R$ 600,00 “tem que ter um ponto final”, mas “não será R$ 200,00 nem de R$ 600,00, estamos discutindo”.

Nesta tarde, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, também disse que é preciso construir um consenso sobre o Renda Brasil e que a proposta precisa olhar a situação fiscal.

Com a piora local, o índice descolou do cenário externo, onde a maioria das Bolsas encerrou em alta. As Bolsas refletiram indicadores positivos enquanto investidores aguardam o discurso do presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), Jerome Powell, no simpósio de Jackson Hole, amanhã.

Entre as maiores quedas do Ibovespa ficaram as ações da Cemig (CMIG4 -4,04%), da Eletrobras (ELET6 -4,52%) e da Embraer (EMBR3 -4,56%). Os papéis da Eletrobras sentiram reflexo do impasse sobre o pacote e temor de atrasos nas privatizações previstas. Na contramão, as maiores altas foram da Marfrig (MRFG3 1,34%), do Magazine Luiza (MGLU3 2,44%) e do Grupo NotreDame Intermédica (GNDI3 3,24%).

O Magazine Luiza abriu um novo programa de recompra de ações, já o Grupo Notre Dame Intermédica comprou, por R$ 1 bilhão, a OSI Participações, controladora da Medisanitas Brasil, que concentra as operações brasileiras do grupo empresarial colombiano Keralty, especialista em saúde integrada.

Na agenda de amanhã, o destaque será o discurso de Powell às 10h10, mas o dia também será cheio de indicadores relevantes, como a segunda leitura do Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos e os pedidos de seguro-desemprego do país, às 9h30.

O dólar comercial fechou em forte alta de 1,59% no mercado à vista, cotado a R$ 5,6170 para venda, descolado do exterior, em dia de estresse no mercado doméstico com investidores reagindo às declarações do presidente Jair Bolsonaro sobre a suspensão do programa Renda Brasil, reforçando as incertezas quanto ao cenário fiscal do país e da permanência de Paulo Guedes no ministério da Economia.

Para o diretor da Correparti, Ricardo Gomes, as evidências do desgaste de Guedes junto ao Planalto foram o pano de fundo do movimento da moeda no mercado local. “Inevitavelmente, resultará na demissão do ministro, mais cedo ou mais tarde. É somente uma questão de tempo. Essa é a leitura do mercado”, comenta.

Ele acrescenta que, o que está em jogo, é o risco do descontrole fiscal com a possível saída do ministro da Economia, o que reflete diretamente no preço dos ativos.

“Há fuga de recursos do país em larga escala, evidenciando o desconforto dos investidores em relação ao rombo das contas públicas do país. Além da truculência e morosidade no avanço das reformas estruturantes que o Brasil necessita”, reforça. Em meio ao impasse do texto do programa Renda Brasil, a equipe econômica tem até sexta-feira para apresentar a nova proposta ao presidente Bolsonaro.

Sobre as incertezas quanto a possível saída de Guedes, o economista-chefe da Necton Corretora, André Perfeito, avalia que “tem cara de boato”.

“O mercado procura uma boa desculpa para realizar e motivos não faltam. Hoje, o presidente ajudou neste processo ao comunicar de maneira desencontrada sua visão contrária ao desenho atual do Renda Brasil. O mercado sentiu o cheiro de piora das relações entre o Planalto e o ministério da Economia e entrou no modo ‘vendido’ aqui”, diz.

Para a economista da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack, amanhã o mercado deverá manter o “clima” de aversão ao risco. “A tendência é essa, a não ser que tenha alguma sinalização do governo que traga um respiro ao mercado, o que acho difícil”, diz.

Na agenda de indicadores, tem a segunda leitura do Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos no segundo trimestre e o presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), Jerome Powell, participará de um simpósio de política econômica em Jackson Hole. “O que sempre demanda atenção dos investidores”, acrescenta a economista.

As taxas dos contratos de juros futuros (DIs) encerraram a sessão em alta, com o ritmo de colocação de prêmios oscilando ao sabor dos ruídos políticos vindos de Brasília, diante do impasse entre o ajuste fiscal defendido pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e a agenda popular pretendida pelo presidente Jair Bolsonaro com vistas à eleição de 2022.

Ao final da sessão regular, o DI para janeiro de 2022 ficou com taxa de 2,83%, de 2,75% no ajuste anterior; o DI para janeiro de 2023 terminou projetando taxa de 4,07%, de 3,93% após o ajuste ontem; o DI para janeiro de 2025 encerrou em 5,96%, de 5,75%; e o DI para janeiro de 2027 tinha taxa de 6,97%, de 6,76%, na mesma comparação.

Os principais índices do mercado de ações norte-americano fecharam em alta, com renovação de máximas do S&P 500 e do Nasdaq, após a divulgação de pedidos de bens duráveis bem acima do esperado, em um momento no qual os investidores estão otimistas de que os bancos centrais continuarão apoiando a economia com taxas de juros baixas e compra de dívida do governo.

Confira abaixo a variação e a pontuação dos principais índices de ações dos Estados Unidos no fechamento:

Dow Jones: +0,30%, 28.331,92 pontos

Nasdaq Composto: +1,73%, 11.665,06 pontos

S&P 500: +1,01%, 3.478,73 pontos