Chance de Powell anunciar momento do tapering em Jackson Hole é reduzida

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São Paulo – O simpósio de Jackson Hole, que acontece na sexta-feira, ficou famoso por ser o palco de mudanças importantes na política monetária do Federal Reserve (Fed) a exemplo da nova estratégia para a inflação anunciada no evento de 2020. Este ano, no entanto, especialistas duvidam que o presidente do banco central norte-americano, Jerome Powell, revele o tão aguardado prazo para a redução das compras de ativos (tapering, em inglês), já que a variante Delta aumentou os riscos para as perspectivas econômicas nos Estados Unidos.

“Embora Powell possa decidir dar mais algum reconhecimento de que o início do processo de redução gradual está se aproximando, duvidamos que ele esteja preparado para fazer uma declaração definitiva esta semana. Os dados recebidos, incluindo a propagação da variante Delta, serão um fator determinante em relação ao momento exato da decisão de redução gradual”, disse o economista sênior do Wells Fargo para os Estados Unidos, Sam Bullard.

Desde março do ano passado, o Fed vem mantendo a taxa de juros na faixa entre zero e 0,25% ao ano para ajudar a economia norte-americana a atravessar a crise provocada pela pandemia de covid-19. Na ocasião, o banco central também retomou as compras de ativos, atualmente no ritmo de US$ 120 bilhões ao mês.

No entanto, um rápido processo de vacinação contra a covid-19 nos Estados Unidos permitiu que a economia fosse reaberta antes do previsto, promovendo uma recuperação mais forte do que o esperado. Sob esse cenário, o mercado e os membros do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) passaram a se questionar se as compras de ativos seguem eficazes como no auge da crise pandêmica, já que são desenhadas para apoiar a demanda e hoje os Estados Unidos enfrentam gargalos de oferta.

“É improvável que o simpósio ofereça qualquer informação materialmente nova sobre o tempo e o caminho para o Fed reduzir as compras de títulos. Seria bastante surpreendente se assim fosse, dado o tom das comunicações recentes”, afirmou o vice-presidente da Scotiabank Economics, Derek Holt, citando a ata da reunião de 27 e 28 de julho.

Na semana passada, o documento mostrou um debate acalorado entre os membros do comitê sobre o processo de redução gradual das compras mensais de US$ 80 bilhões em títulos do Tesouro e US$ 40 bilhões em títulos lastreados em hipotecas. As visões variaram entre o início do tapering neste ano e no ano que vem, com membros indicando que não há necessidade de aguardar um progresso substancial na direção das metas de pleno emprego e estabilidade de preços, enquanto outros preferem o corte das hipotecas primeiro, citando um mercado imobiliário aquecido.

Para o economista chefe e estrategista global da ADM Investor Services, Marc Ostwald, o maior desafio de Powell em Jackson Hole será moldar alguma forma de orientação consensual do Fomc e não deixar os mercados se sentindo confusos e perturbados por uma cacofonia de perspectivas políticas dissonantes.

“Como a ata do Fomc destacou, há um espectro muito amplo de opiniões sobre em que deve-se dar maior ênfase, seja no cuidado devido aos riscos negativos da variante Delta, preocupação de que as pressões inflacionárias possam ser mais persistentes e menos transitórias, ou se o foco deve ser no mercado de trabalho, e como julgar o impulso sólido na recuperação do emprego, ao mesmo tempo em que se leva em conta que cerca de 11 milhões continuam a solicitar benefícios ao desemprego”, afirmou Ostwald.

Recentemente, um sinal importante na direção do momento do tapering veio do presidente do Fed de Dallas, Robert Kaplan, um dos primeiros membros do Fomc a defender publicamente a retirada antecipada da política de dinheiro fácil do banco central norte-americano.

Falando à Fox Bussiness na sexta-feira, Kaplan – que este ano não tem direito a voto – disse que poderia rever sua visão sobre a redução das compras de ativos por conta da variante Delta. Até então, ele vinha defendendo que o processo começasse em outubro deste ano.

“A visão de que o Fed pode reduzir as compras de ativos em setembro e se mover de maneira mais agressiva para concluir esse processo até meados do ano que vem permanece minoria no Fomc e é mantida por presidentes regionais do Fed não votantes, incluindo [James] Bullard [de Saint Louis], Kaplan, [Esther] George [de Cleveland] e [Eric] Rosengren [de Boston] sendo que Kaplan começou a suavizar um pouco sua posição”, disse Holt, da Scotiabank Economics.

PROGRESSO SUBSTANCIAL

Desde que a economia norte-americana começou a dar sinais sólidos de recuperação – com crescimento de 6,3% no primeiro trimestre e expansão de 6,5% no segundo trimestre – a necessidade de uma política extremamente acomodatícia passou a ser questionada dentro e fora do Fed.

Powell, no entanto, vem reforçando a premissa de que a retirada da acomodação deve acontecer quando progressos substanciais reais na direção das metas de pleno emprego e estabilidade de preços forem atingidos.

Mas os Estados Unidos ainda têm cerca de 6 milhões de pessoas fora do mercado de trabalho e a inflação segue galopante –o dobro da meta de 2% do Fed se considerarmos o índice de preços para gastos pessoais (PCE, na sigla em inglês), a medida preferida do banco central norte-americano para a inflação.

“Nossas expectativas não mudaram. O mercado de trabalho permanece quase 6 milhões de empregos aquém de onde estava antes da pandemia e, apesar da aceleração mais recente no ímpeto de contratações, ainda acreditamos que o Fomc desejará ver mais progresso em direção à sua meta de emprego máximo antes de desacelerar a acomodação monetária”, afirmou Bullard, do Wells Fargo.

Segundo ele, embora a redução das compras de ativos seja um tópico de discussão no simpósio Jackson Hole desta semana, sua projeção é de que o Fed anuncie oficialmente o tapering no final deste ano e dê início à diminuição real das compras no início de 2022.

Já Holt, da Scotiabank, acredita que Powell repetirá em Jackson Hole sua visão sobre as condições para que o progresso substancial seja alcançado em um cenário no qual a variante Delta se espalha nos Estados Unidos.

“Embora eu não espere anúncios sobre o tapering em Jackson Hole, isso não significa que Powell não terá nada para falar. Ele provavelmente repetirá a mensagem sobre o progresso substancial, explicará por que um potencial tapering poderia ser menos severo do que em 2013, por que pode haver mais vulnerabilidades em torno dos fluxos de capital e tratar do debate sobre por que vimos alguns indicadores econômicos enfraquecidos recentemente”, afirmou Holt.

Este último tópico, segundo o vice-presidente da Scotiabak Economics, pode dominar a atenção do Fed enquanto avalia o possível impacto da variante Delta sobre a economia.