Alteração na LDO 2021 muda pouco o cenário para Selic, dizem especialistas

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São Paulo – A decisão do Congresso de aprovar um projeto de lei que remove as despesas com a pandemia do teto de gastos terá pouco efeito sobre a visão do Banco Central (BC) a respeito do balanço de riscos à inflação e, consequentemente, sobre a trajetória da taxa básica de juros, a Selic, segundo especialistas ouvidos pela Agência CMA.

Para o estrategista-chefe do Banco Mizuho, Luciano Rostagno, embora haja uma “possibilidade aberta” para que o governo aumente as despesas contra a covid-19 para muito além dos quase R$ 100 bilhões estimados para este ano, não quer dizer que esta hipótese será concretizada.

“Não acho que isso seja suficiente para fazer com que o BC mude o plano de voo, que é de manter o ritmo de alta da Selic em 75 pontos-base na próxima reunião”, disse o estrategista.

Marcelo Toledo, economista-chefe da Bradesco Asset Management (BRAM), pondera que a decisão de ampliar despesas por meio de créditos extrateto será interpretada pelo Comitê de Política Monetária (Copom) como um fator de aumento dos riscos fiscais, mas não como uma ruptura do regime fiscal.

“Portanto, acreditamos que esse evento não satisfaz a condição indicada pelo Copom para modificar a sinalização de aumento de 75 pontos-base na próxima reunião”, disse Toledo. “Contudo, deverá elevar a preocupação do Copom sobre o cenário alternativo, que tem sido contemplado nas discussões de política monetária, de deterioração fiscal. Ou seja, aumenta a probabilidade de concretização desse cenário adverso, ainda que siga como um cenário apenas de risco, isto é, de baixa probabilidade.”

CONTEXTO ECONÔMICO

Rostagno apontou que os últimos dados de inflação vieram abaixo do esperado, que as taxas de juros de longo prazo nos Estados Unidos estão perdendo força e que os preços das commodities “apresentaram certa acomodação” – todos estes fatores que podem contrabalançar um eventual aumento do risco fiscal calculado pelo BC.

Além disso, há ainda muita incerteza em relação ao desempenho da economia. O estrategista do Mizuho afirmou que a atividade “deve ter sofrido impacto relevante no mês de março, o que deve ter se estendido para o mês de abril. Acho que ainda não há fatos que levem o BC a mudar o plano”.

Ele ressaltou que eventuais novas despesas do governo no combate à pandemia também podem ter um efeito positivo sobre a economia – e não só os efeitos negativos decorrentes da percepção de quebra da disciplina fiscal.

“Estes gastos já se mostraram bem-sucedidos no ano passado. Estes dois programas – BEm e Pronampe – foram considerados efetivos, que realmente tiveram bons resultados. A gente não está vendo uma ruptura na política fiscal do país, a gente está tendo sim autorização para mais gastos temporários, mas que ao mesmo tempo podem vir com contrapartidas que melhorem a perspectiva da dívida pública no médio e longo prazo”, afirmou.

Rostagno citou como exemplo a atitude do governo no caso da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que reinstituiu o auxílio emergencial. Ao mesmo tempo em que elevou a despesa, o texto também introduziu gatilhos para um ajuste fiscal automático das despesas federais. Algo semelhante poderia acontecer com a reforma administrativa, se houvesse elevação das despesas.

“A gente está começando a ver debate em torno da reforma administrativa voltar a evoluir, avançar, então se houver avanços nesse front, isso mitiga o impacto negativo desse aumento de gastos para conter a covid no país.”

O Mizuho espera alta de 0,75 ponto porcentual (pp) na Selic na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), e prevê que a taxa terminará este ano em 5,50%, subindo no ano que vem para 6,5% – nível que o banco considera equivalente ao da taxa de juros neutra no Brasil.

Gustavo Nicoletta / Agência CMA (g.nicoletta@cma.com.br)