Com fuga de estrangeiros, exportações deverão ajudar fluxo cambial

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São Paulo – Diante da forte saída de recursos estrangeiros do país, o fluxo cambial do Brasil está negativo em quase US$ 13 bilhões no acumulado do ano até meados deste mês. As principais razões para isso são as incertezas políticas, a deterioração do cenário econômico global por causa da pandemia do novo coronavírus e a sucessiva queda da taxa básica de juros (Selic), resultando em desvalorização do real.

Se por um lado, a saída de dólares no período pela via financeira sustenta parte desses números, a balança comercial pode minimizar o ritmo dessas retiradas por meio das exportações nos próximos meses.

Segundo dados do Banco Central (BC), o fluxo cambial do ano até 17 de abril estava negativo em US$ 12,8 bilhões, enquanto na comparação com o mesmo período de 2019, o resultado era positivo em US$ 1,295 bilhão. A saída pela via financeira segue forte, somando US$ 30,1 bilhões no mesmo período.

Acompanhe a recente saída de fluxo cambial do país por semana

O QUE DIZEM OS ESPECIALISTAS SOBRE O FLUXO CAMBIAL

O economista da Tendências Consultoria, Sílvio Campos, reforça que não há expectativa de melhora para o fluxo financeiro, uma vez que o histórico de 2019 foi bastante negativo.

“Aqui, não temos mais o fator de diferencial de juros, com a taxa caindo sucessivamente. Por enquanto, não vejo nenhuma melhora pela via financeira e um cenário ruim já era esperado. Porém, a pancada foi maior em decorrência do novo coronavírus”, diz.

Segundo o economista, o saldo da balança comercial deverá ser impacto pelas quedas das importações, em meio à expectativa de retração do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro e à depreciação cambial, já que o dólar acumula valorização de mais de 40% frente ao real desde o início de 2020.

“O resultado da balança comercial deve ser melhor que o esperado no início do ano, mas não melhor do que o resultado de 2019 por causa das importações e desses fatores”, diz. Porém, o fluxo comercial deverá minimizar o “estrago” provocado pela via financeira, puxado pelas exportações, no qual o saldo deve cair em “ritmo menor”, diz.

O economista-chefe da Órama Investimentos, Alexandro Espírito Santo, pondera que, mesmo em meio à pandemia, que resulta em queda na demanda, nenhum país vai deixar de “comprar comida”, uma vez que a exportação de commodities agrícolas é um dos pontos fortes do Brasil.

“A demanda caiu sim, mas ninguém deixa de comprar comida e é o nosso forte. Ainda mais com previsão de safra recorde neste ano”, comenta. De acordo com o último levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgado no início do mês, a produção de grãos deve chegar a 245,2 milhões de toneladas.

Para Espírito Santo, a pós-pandemia pode culminar em “fechamento” dos mercados e, consequentemente, na redução de acordos bilaterais. Mas o Brasil poderá se beneficiar desse cenário. “Na minha cabeça, o mundo deverá se fechar, pode ser em câmera lenta. O Brasil pode ter um trunfo caso essa situação se firme porque sempre fomos muito lentos em termos de negociação comercial, tanto que nosso fluxo de comércio é muito baixo. Pode ser que a gente tenha uma vantagem muito competitiva com o mundo”, salienta.

Apesar da forte saída de fluxo financeiro, Campos, da Tendências, chama atenção para uma redução na saída de recursos estrangeiros, uma vez que a taxa de câmbio opera em patamares históricos. Ele explica que moeda muito depreciada desestimula a saída de fluxo financeiro por meio de remessas de lucros e despesas com serviços, por exemplo.

“Esse patamar acima de R$ 5,50 desestimula essa saída porque fica mais caro tirar dinheiro daqui. A taxa de câmbio pode até ajudar no reequilíbrio do movimento de fluxos”, avalia.