Comissão aprova PEC dos Precatórios e mudança no teto de gastos

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São Paulo – A comissão especial da Câmara dos Deputados que analisava a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 23/2021, sobre o parcelamento dos precatórios federais, aprovou o parecer do relator Hugo Motta (Republicanos-PB) por 23 votos a 11. O texto também inclui medidas que alteram o teto de gastos. Em conjunto, as medidas previstas na PEC abrem um espaço de R$ 83 bilhões no orçamento federal de 2022.
A PEC traz as saídas encontradas pelo governo para encaixar no orçamento de 2022 e no teto de gastos o chamado Auxílio Brasil – programa social que resultará de um incremento no Bolsa Família – e uma conta de R$ 89 bilhões em precatórios – dívidas decorrentes de derrotas da administração pública em disputas judiciais.
A aprovação da PEC – que ainda precisa ser chancelada pelo plenário da Câmara dos Deputados e pelo Senado – abrirá espaço no orçamento para o Auxílio Brasil. O governo já anunciou que os benefícios do programa social serão reajustados em 20% a partir de novembro. A meta estabelecida pelo presidente Jair Bolsonaro é chegar a um mínimo de R$ 400 para 17 milhões de famílias em situação de pobreza e extrema pobreza.
Deputados contrários à PEC tentaram adiar a votação para a próxima semana, sob o argumento de que o texto é complexo e foram incluídas mudanças apresentadas menos de 30 minutos antes do início da reunião. Mas a decisão do presidente da comissão especial, deputado Diego Andrade (PSD-MG), era encerrar a votação nesta noite.
Parlamentares de oposição disseram que a medida tem caráter eleitoral e que o governo vai dar o calote nos beneficiários dos precatórios. “O governo não precisa dar esse calote e a Câmara, em respeito à Constituição, não pode aceitar, usando os mais necessitados e apresentando uma promessa vazia de auxílio”, disse a deputada Maria do Rosário (PT-RS).
“A intenção do governo é eleitoral. É criar espaço para gastar em 2022, que é um ano eleitoral. E dizer que o auxílio vai durar um ano, exatamente no ano eleitoral”, afirmou a deputada Lídice da Mata (PSB-BA).
PARCELAMENTO DE PRECATÓRIOS
Hoje, a lei autoriza o parcelamento se o precatório for, sozinho, equivalente a 15% de toda a despesa que o governo federal terá com os precatórios. Neste caso, o pagamento pode ser dividido em seis parcelas – a primeira de 15% do valor total e os outros 85% divididos em cinco prestações anuais e iguais.
A proposta originalmente apresentada pelo governo federal incorporava mais duas regras de parcelamento. Na primeira, seriam automaticamente parcelados os precatórios iguais ou superiores a mil vezes o teto das Requisições de Pequeno Valor (RPV). Atualmente, isso significa que seriam parcelados automaticamente os precatórios iguais ou maiores que R$ 66 milhões.
Além disso, a PEC original do Planalto determinava que haverá parcelamento se a soma dos precatórios superar em 2,6% a receita corrente líquida (RCL) dos 12 meses anteriores. Neste caso, o parcelamento seria feito do maior para o menor precatório. Por último, a PEC amplia o número de parcelas para dez – a primeira de 15% do valor total e os outros 85% divididos em nove prestações anuais e iguais.
Motta fez alterações ao sistema de parcelamento proposto pelo Executivo. No substitutivo apresentado por ele, fica estabelecido um limite anual para as despesas com precatórios equivalente ao que foi pago em 2016 e corrigido pela inflação, menos a projeção para a despesa com o pagamento de requisições de pequeno valor para o mesmo exercício, que terão prioridade no pagamento.
O pagamento dos precatórios que ficarem fora deste limite será adiado para o ano seguinte. Nestes casos, haverá uma chance de eles serem pagos antecipadamente se a pessoa ou instituição que tem direito a receber o precatório aceitar uma redução de 40% no valor do pagamento.
A PEC apresentada pelo Planalto previa também a criação de um fundo cujos recursos serão usados para liquidar com mais rapidez os passivos da União. Motta removeu a criação deste fundo no substitutivo.
ENCONTRO DE CONTAS
Outro ponto da PEC apresentada pelo Planalto permitia o chamado “encontro de contas” da União com devedores, caso estes devedores tenham sido contemplados com precatórios, de forma a evitar um desembolso dos cofres públicos.
Sob a PEC original, se a União tivesse de pagar precatórios a um devedor do setor privado, o valor será depositado não mais à disposição do juiz que condenou a Fazenda, mas à disposição do juiz responsável pela ação em que a União cobra o devedor do setor privado. Este juiz é quem decidiria se o devedor recebe o dinheiro decorrente dos precatórios.
Se o precatório fosse devido para o setor público, e o ente possuísse dívidas contratuais com a União, a PEC original previa a possibilidade de o crédito vindo do precatório ser usado para cancelar os débitos pendentes do devedor.
A PEC original também determinava que, a partir do momento de sua promulgação, os valores dos precatórios de todas as esferas – federal, estadual e municipal – serão corrigidos pela taxa básica de juros, a Selic, definida pelo Banco Central.
Motta manteve a possibilidade de encontro de contas, mas delineou mais claramente que tipo de transação seria permitida a partir desta possibilidade.
No substitutivo, determinou que será possível quitar débitos parcelados ou débitos inscritos em dívida ativa, comprar imóveis públicos, pagar outorgas de delegações de serviços públicos, comprar fatia minoritária em empresa estatal e adquirir direitos de antecipação de valores a serem recebidos a título do excedente em óleo em contratos de partilha de petróleo.
Motta também detalhou as possibilidades de encontro de contas no caso de o credor ser entidade do setor público. Nestes casos, será possível amortizar dívidas, vencidas ou vincendas, em contratos de refinanciamento, nos contratos de prestação de garantia, nos parcelamentos de tributos ou contribuições sociais e relativas a obrigações decorrentes do descumprimento de prestação de contas ou desvio de recursos.
Essa amortização deverá ser aplicável primeiro às parcelas mais antigas, no caso das obrigações vencidas, e uniformemente nas obrigações a vencer, mantida a duração original do respectivo contrato ou parcelamento.
TETO DE GASTOS
A surpresa maior na versão final do texto apresentado por Motta e aprovado ontem pela comissão foi uma alteração na forma como é calculado o teto de gastos do governo federal e a inserção de um dispositivo que abre espaço para R$ 15 bilhões em novas despesas da União neste ano.
A regra atual do teto de gastos determina que as despesas federais devem ser corrigidas anualmente pela inflação acumulada nos 12 meses até junho do exercício anterior ao da lei orçamentária – ou seja, para o orçamento de 2021, a correção do teto de gastos foi feita de acordo com a variação do Indice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de julho de 2019 até junho de 2020.
Sob a nova proposta, de Motta, a inflação que corrigiria o teto é a do exercício anterior. Isso quer dizer que o teto de gastos deste ano, por exemplo, seria corrigido pela variação do IPCA acumulada de janeiro a dezembro de 2020. Um dos problemas desta alteração são as dificuldades que ela traria para a elaboração do orçamento. O relator propôs outras mudanças para mitigar estas dificuldades.
A PEC diz que no caso do Projeto de Lei de Orçamento Anual, o Executivo considerará a variação do IPCA acumulada até junho e o valor estimado até dezembro. Estas estimativas seriam elaboradas pelo Executivo e atualizadas mensalmente juntamente com os demais parâmetros macroeconômicos.
A diferença entre as projeções e a inflação apurada também será calculada pelo Executivo e comunicada aos demais Poderes, e o resultado seria compensado no cálculo do teto de gastos dos próximos anos.
Além disso, Motta inseriu no texto dispositivo determinando que a compensação possa ser feita a partir deste ano. Em 2021, ela ficaria limitada a R$ 15 bilhões a serem destinados “exclusivamente ao atendimento de despesas de vacinação contra a covid-19 ou relacionadas a ações emergenciais e temporárias de caráter socioeconômico”.
As operações de crédito realizadas para custear o aumento de limite ficam fora das restrições da regra de ouro – que impede operações de crédito para custear despesas correntes – e determina que elas devem ser atendidas por meio de créditos extraordinários. Também remove a necessidade de este crédito ser admitido somente para despesas imprevisíveis.
O relator também incluiu dispositivo que extingue a revisão de 2026 nas regras do teto de gastos, e justificou a decisão dizendo que a alteração seria feita agora. “Em 2016 não estava escrito que teríamos uma pandemia. Não é um bom motivo para antecipar a revisão?”, afirmou, durante reunião da comissão especial que analisa a PEC.
PARCELAMENTO DE DÉBITOS PREVIDENCIÁRIOS
Motta incluiu na PEC ainda um outro assunto não relacionado aos precatórios: o parcelamento das contribuições previdenciárias e demais débitos dos municípios, incluídas suas autarquias e fundações, com os respectivos regimes próprios de previdência social.
Sob a alteração proposta por ele, fica autorizado o parcelamento destas contribuições com vencimento até 31 de dezembro de 2020 no prazo máximo de 240 prestações mensais, mediante autorização em lei municipal específica, desde que comprovem ter alterado a legislação do regime próprio de previdência para cumprir algumas condições.
Da mesma forma, também foi incluído no texto o parcelamento dos débitos decorrentes de contribuições previdenciárias dos municípios com o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) com vencimento até 30 de setembro de 2021 no prazo máximo de 240 prestações mensais.
Entre as condições para o parcelamento estão a adoção de regras de elegibilidade, cálculo e reajustamento dos benefícios para equipará-las às dos servidores públicos do Regime Próprio de Previdência Social da União, a adequação do rol de benefícios e das alíquotas ao que estava previsto na reforma da Previdência de 2019 e a instituição de regime de previdência complementar e adequação do órgão ou entidade gestora do regime próprio de previdência social.
A formalização dos parcelamentos precisaria ocorrer até 30 de junho de 2022 e ficará condicionada à autorização de vinculação do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) para fins de pagamento das prestações acordadas nos termos de parcelamento.