Pfizer ficou 2 meses sem resposta sobre vacina, diz Wajngarten à CPI da covid

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São Paulo – A carta enviada pela Pfizer para várias autoridades do governo brasileiro para tratar de prioridade no envio de vacinas contra a covid-19 ao país ficou quase dois meses sem resposta, segundo o ex-secretário de comunicação da presidência, Fabio Wajngarten.

Em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado que apura se houve erros e omissões do governo no combate à covid-19, ele disse que respondeu à carta da Pfizer porque as autoridades a que a carta foi endereçada não fizeram isso.

A carta fora endereçada ao presidente Jair Bolsonaro, ao gabinete do presidente, ao vice-presidente Hamilton Mourão, ao ministro da Economia, Paulo Guedes, ao ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, ao então ministro da Casa Civil, Braga Netto, e ao embaixador do Brasil nos Estados Unidos, Nestor Forster.

“Até o dia 9 de novembro ninguém havia respondido a essa carta”, disse Wajngarten à CPI. Ele acrescentou que ficou sabendo do documento por meio de um dono de veículo de comunicação – Marcelo de Carvalho, dono da RedeTv -, e que em seguida tentou contato por e-mail com a Pfizer.

No mesmo dia, segundo Wajngarten, o presidente da Pfizer no Brasil, Carlos Murillo, teria telefonado para ele. O ex-secretário disse que, a partir deste momento, levou o assunto para o presidente Jair Bolsonaro.

“Neste exato momento em que presidente da Pfizer me ligou, subi para gabinete do presidente, peguei ajudante de ordens, pedi autorização, depois do almoço, das 14h30, falei: ‘estou com presidente da Pfizer na linha’. Ele despachava com ministro Paulo Guedes neste momento. Paulo Guedes fala: ‘é esse o caminho, é esse o caminho. O caminho são as vacinas’.”

“Paulo Guedes conversa rapidamente com o presidente da Pfizer, e o presidente escreve no papel “Anvisa” – uma vez aprovado pela Anvisa, vamos comprar todas as vacinas. Foi uma conversa breve, rápida. Ele desligou, cumprimentou, e eu desci e voltei para a minha sala”, afirmou.

Wajngarten disse que se reuniu no dia 17 de novembro com Murillo e com a diretora de comunicação da companhia. Nenhum outro membro da cúpula do governo participou, segundo ele. No encontro, de acordo com o ex-secretário, não houve negociação sobre os termos do fornecimento, mas Murillo disse desejar que o Brasil fosse “a vitrine na América Latina da vacina da Pfizer”.

Wajngarten disse também que a companhia não ofereceu à época 70 milhões de doses de vacina contra a covid ao Brasil. “Infelizmente nunca foi disponibilizado 70 milhões. As propostas da Pfizer no começo da conversa falavam em irrisórias 500 mil vacinas.”

“Havia uma promessa da Pfizer de que se o Brasil se manifestasse no tempo adequado que envidaria maiores esforços em aumentar quantidade e diminuir o prazo”, disse Wajngarten. Ele disse que exigiu isso da Pfizer posteriormente “nos outros dois encontros que tive com eles”.

Estes dois encontros aconteceram em 7 de dezembro e em 9 de dezembro do ano passado. Ambos aconteceram com a diretora jurídica de Pfizer, segundo Wajngarten, sendo o primeiro para falar da caixa de armazenagem a frio das vacinas da Pfizer, e a outra para falar sobre as cláusulas contratuais que estariam impedindo um acordo entre o governo federal e o laboratório a respeito das vacinas.

Wajngarten também disse que interferiu no contato entre o governo e a PFizer por causa da falta de resposta de outras áreas à companhia e porque vinha sendo cobrado pela imprensa sobre as iniciativas do governo federal para a obtenção de vacinas.

“Eu quis encurtar e aproximar pontas diante da negativa de uma carta que não foi respondia e a comunicação sofria com isso através dos inúmeros questionamentos que a gente recebia”, afirmou.

“Pode imaginar qual era a pressão da imprensa em atacar o governo dizendo que não tem vacina”, disse ele. “Meu intuito foi ajudar, criar atalhos para que população brasileira tivesse acesso à vacina”, acrescentou.

CONTATO COM PAZUELLO

Wajngarten disse ter tido pouco contato com ministros, e ressaltou que com o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello a relação restringia-se a cumprimentos quando ambos se encontravam.

“Eu era próximo do ministro [Luiz Eduardo] Ramos, da Casa Civil. Tratei com o ministro Fábio Faria [Comunicações]. Eu poucas vezes conversei com o ministro Pazuello”, disse ele em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado que apura se houve erros e omissões do governo no combate à covid-19,, acrescentando que também mantinha contato com o ministro da Economia, Paulo Guedes.

Wajngarten também listou as campanhas de comunicação relacionadas à pandemia que feitas enquanto estava no governo, e disse que houve pelo menos uma delas por mês desde fevereiro de 2020, sendo a maioria delas relacionadas a medidas de prevenção contra a covid. Ele mencionou também campanhas sobre o atendimento precoce – veiculadas em outubro e novembro do ano passado – e a vacinação, a partir de dezembro.

Ele ressaltou que onze das campanhas vieram por iniciativa do Ministério da Saúde – entre elas as de atendimento precoce -, e que apenas quatro foram originadas na secretaria de comunicação. A aprovação destas campanhas cabia à área que a originou, afirmou.

O ex-secretário disse também que sempre teve “toda liberdade possível” para comandar a secretaria de comunicação, “sem absolutamente nenhuma interferência de ninguém”, e disse que se percebesse tentativa de intromissão “teria ido embora”.

DECLARAÇÕES DE BOLSONARO

As declarações do presidente Jair Bolsonaro demonstrando ser contrário a vacinas tiveram impacto na comunicação, disse Wajngarten.

“Tem impacto? Vou dizer ao senhor: tem impacto. A gente faz campanhas para contrapor, faz campanhas para complementar”, disse ele ao ser questionado pelo relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), sobre se os comentários de Bolsonaro afetaram a comunicação do governo em prol da vacinação.

Posteriormente, o ex-secretário tentou contemporizar, afirmando que o impacto não é único. “Para cada pessoa que recebe informação tem impacto diferente”, afirmou.

AMEAÇA DE PRISÃO

O senador Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI, ameaçou pedir a prisão do ex-secretário de comunicação da presidência Fabio Wajngarten caso reste comprovado que ele fez declarações conflitantes na comissão em comparação às de sua entrevista à revista Veja.

Calheiros afirmou que Wajngarten é “prova da existência” de um gabinete paralelo de aconselhamento do presidente Jair Bolsonaro em relação à forma como conduzir a pandemia, porque não tinha autonomia para fazer a ponte com a Pfizer sobre a compra de vacinas.

“[Wajngarten] iniciou negociação em nome do Ministério da Saúde e se dizendo em nome do presidente. E a prova da existência disso”, disse Calheiros. Ele acrescentou que pedirá à revista Veja o áudio da entrevista que Wajngarten concedeu há algumas semanas para verificar se as declarações dadas à publicação conferem com o que ele disse à CPI.

“Se ele não mentiu, revista terá que pedir desculpas a ele. Se ele mentiu à revista Veja e a esta comissão, vou requerer na forma da legislação processual a prisão do depoente”, afirmou. O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), disse que pediria ainda hoje a gravação da entrevista de Wajngarten à Veja.

Antes disso, Aziz chegou a dizer a Wajngarten que se o ex-secretário continuasse evitando responder diretamente às perguntas da CPI, seria dispensado da audiência e posteriormente convocado como investigado. Mais cedo, ele chegou a suspender a reunião após Wajngarten recusar-se a responder quem estaria orientando erroneamente o presidente Jair Bolsonaro sobre questões relacionadas à doença.

Calheiros questionou Wajngarten sobre o assunto porque o ex-secretário disse em entrevista à revista Veja que “o presidente Bolsonaro está totalmente eximido de qualquer responsabilidade” por problemas na negociação de vacinas com a Pfizer.”

“Se as coisas não aconteceram, não foi por culpa do Planalto. Ele era abastecido com informações erradas, não sei se por dolo, incompetência ou as duas coisas. Diziam que a pandemia estava em declínio e que o número de mortes diminuiria muito até o fim do ano”, disse Wajngarten na entrevista à Veja.

À CPI, porém, Wajngarten negou saber quem estaria orientando erroneamente o presidente. “Desconheço quem tenha orientado.”

Assista a audiência abaixo: