São Paulo – Após mostrar volatilidade com ruídos políticos e o risco fiscal nos últimos dias, o Ibovespa fechou o pregão em alta de 1,50%, aos 102.142,93 pontos, e a semana com ganhos de 0,61%, sustentado por ações como as de bancos e refletindo as mudanças anunciadas ontem pelo Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) na condução de sua política monetária. Há a percepção de que o Fed pode manter juros mais baixos por mais tempo, o que enfraquece o dólar e aumenta o apetite por risco, sendo positivo para Bolsas e para países emergentes.
A preocupação com a situação fiscal permanece, mas foi menos sentida hoje e há expectativa de que o programa Renda Brasil possa ficar para depois. O volume total negociado foi de R$ 23,3 bilhões.
“Essa alta mais forte do Ibovespa tem ligação com a queda acentuada do dólar hoje, devido ao Fed ter mantido uma visão mais ‘dovish’, o que aumenta apetite ao risco. Pode vir mais dinheiro para comprar Bolsa aqui com o dólar mais desvalorizado”, disse o diretor de operações da Mirae Asset Corretora, Pablo Spyer. O dólar comercial caiu 2,83%, a R$ 5,4170 na venda.
Ontem, o presidente do Fed, Jerome Powell, anunciou que a autoridade monetária passará a trabalhar com uma meta de inflação média de 2%, sugerindo que pode ser mais tolerante com a inflação e manter os juros mais baixos por mais tempo.
Entre as ações, as de bancos avançaram e deram sustentação ao Ibovespa por terem grande peso e serem sensíveis ao risco, caso do Bradesco. Já as maiores altas do índice foram da Cyrela e da Rumo. A Cyrela teve sua recomendação elevada para compra pelo J.P.Morgan, além de refletir o oferta pública inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) da sua controlada, a Cury Construtora.
Na contramão, entre as maiores quedas ficaram com as ações de exportadoras, que sentem a queda do dólar, caso da Marfrig e JBS. Ao lado dos frigoríficos, ficaram os papéis do IBR Brasil e da Braskem, que caem após notícias de que a companhia e os seus executivos foram alvo de ação coletiva nos Estados Unidos, acusados de não terem informado aos acionistas a extensão dos problemas que a Braskem causou em Maceió (AL).
Na cena política doméstica, continua o receio em relação à situação fiscal, com dúvidas sobre os impactos da proposta que será apresentada por Guedes ao presidente Jair Bolsonaro. Segundo analistas, há rumores de que o ministro da Economia, Paulo Guedes, irá sugerir estender o auxílio emergencial no valor de R$ 300,00, como deseja Bolsonaro, mas que o Renda Brasil seja lançado em outro momento.
Há pouco, em evento do setor siderúrgico, Guedes reiterou o seu compromisso com o teto de gastos e com a agenda de reformas, sem dar detalhes ainda sobre o programa.
Na semana que vem, a questão fiscal promete continuar no foco já que segunda-feira é a data limite para que o governo apresente a proposta do orçamento de 2021 e ainda são aguardadas as medidas. Já na agenda de indicadores, na terça-feira, será divulgado o Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre do Brasil.
A agenda também está cheia no exterior, com destaque para os dados do mercado de trabalho norte-americano, conhecidos como payroll, na sexta-feira. Ainda nos Estados Unidos, continuam negociações sobre novo pacote de ajuda à economia.
O dólar comercial fechou em forte queda de 2,83% no mercado à vista, cotado a R$ 5,4170 para venda, no menor valor de fechamento desde o dia 13 e na maior queda percentual diária desde 5 de junho (-2,86%), refletindo o apetite ao risco que prevaleceu no exterior com investidores digerindo o anúncio do Fed ontem sobre a mudança de estratégia quanto a inflação média. Diante disso, a moeda interrompeu a sequência de três altas seguidas ao se desvalorizar 3,4% na semana.
“O principal indutor foi a nova estratégia do Fed para a política monetária que, a partir de ontem, passou a considerar a inflação média, que se traduz em juros baixos por um longo período nos Estados Unidos”, comenta o diretor superintendente de câmbio da Correparti, Jefferson Rugik.
Ele acrescenta que, diante da forte desvalorização da moeda norte-americana no exterior ante as principais divisas pares e de países emergentes, investidores locais “partiram” para um “desmonte de posições defensivas”, levando o dólar a renovar mínimas sequenciais no patamar de R$ 5,40.
O economista da Guide Investimentos, Alejandro Ortiz, destaca que, aqui, um “apaziguamento” no risco político fiscal corroborou para a forte queda da moeda junto ao repasse de R$ 325,0 bilhões do Banco Central (BC) para o Tesouro Nacional.
“Após o susto do mercado no meio da semana com a rejeição do presidente [Jair] Bolsonaro à proposta do programa Renda Brasil, houve um apaziguamento. Em nenhum momento, o presidente sinalizou que vai gastar mais ao rejeitar a proposta e o mercado entendeu isso”, pondera.
A equipe econômica da Capital Economics avalia que investidores seguirão monitorando “de perto” as discussões orçamentárias para 2021. “Nosso cenário básico é que qualquer afrouxamento da regra do limite de gastos para o ano que vem será acompanhada por reformas estruturais destinadas a conter o crescimento dos gastos obrigatórios e aumentar a produtividade. Essa compensação seria positiva para o real em relação aos níveis atuais”, reforça.
Na próxima semana, além da pauta fiscal no país, a agenda de indicadores robusta deverá fazer preço com a divulgação do resultado dos índices dos gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês) da indústria e do setor de serviços na China, na Europa e nos Estados Unidos, além dos números do mercado de trabalho norte-americano.
Aqui, tem o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) no segundo trimestre e os dados da produção industrial em julho. “O dado [PIB] deve refletir a retração do consumo das famílias e da formação bruta de capital fixo, refletindo as medidas de distanciamento social e o elevado nível de incertezas do período”, dizem os analistas do Bradesco. Eles acrescentam que, lá fora, os indicadores de atividade deste mês podem mostrar alguma acomodação do setor de serviços, com a indústria em expansão.
Por fim, o analista da Toro Investimentos, Daniel Herrera, diz que na segunda-feira, último pregão de agosto, a moeda norte-americana poderá passar por alguma correção após a forte queda hoje. Tem ainda a formação de preço da taxa Ptax – média das cotações apuradas pelo BC – de fim de mês que provocam volatilidade na sessão.
“Na semana que vem, volta à pauta a questão fiscal e o mercado ficará atento aos sinais do ministro [da Economia] Paulo Guedes e a relação com o presidente Bolsonaro”, observa.
As taxas dos contratos de juros futuros (DIs) encerraram a sessão em queda, mantendo a trajetória desde a abertura do pregão, influenciadas pelo recuo acelerado do dólar, que cai ao redor de 2,5% e é cotado abaixo de 5,45, ainda sob impacto do discurso do presidente do Fed, Jerome Powell ontem. Com isso, os investidores deixam o risco fiscal em segundo plano, aproveitando o dia para ajustar os exageros recentes, quando o movimento de incorporação de prêmios ganhou força.
Ao final da sessão regular, o DI para janeiro de 2022 tinha taxa de 2,82%, de 2,87% no ajuste anterior; o DI para janeiro de 2023 projetava taxa de 4,01%, de 4,11% após o ajuste ontem; o DI para janeiro de 2025 estava em 5,82%, de 5,98%; e o DI para janeiro de 2027 tinha taxa de 6,78%, de 6,96%, na mesma comparação.
Os principais índices do mercado de ações norte-americano fecharam o dia em alta, após o avanço moderado dos gastos do consumidor em julho e ainda sob o efeito das mudanças anunciadas ontem pelo presidente do Fed que devem manter a taxa básica de juros mais baixa por mais tempo. Na semana, os índices consolidaram fortes ganhos.
Confira abaixo a variação e a pontuação dos principais índices de ações dos Estados Unidos no fechamento:
Dow Jones: +0,57%, 28.653,87 pontos
Nasdaq Composto: +0,30%, 11.695,63 pontos
S&P 500: +0,67%, 3.508,01 pontos