São Paulo – A Americanas, em recuperação judicial, detalhou hoje o funcionamento da fraude em suas demonstrações financeiras anunciada ontem.
A diretoria antiga fez diversos contratos de verba de propaganda cooperada e instrumentos similares (VPC) artificialmente criados para melhorar os resultados operacionais que atingiram o saldo de R$ 21,7 bilhões em 30 de setembro de 2022.
Além disso, a ausência de lançamentos de juros sobre operações financeiras, que deveriam ter transitado pelo resultado ao longo do tempo, totalizando o saldo de R$ 3,6 bilhões em 30 de setembro de 2022. Portanto, no que diz respeito aos resultados da companhia ao longo do tempo, a fraude descrita ajudou a incrementá-lo em R$ 25,3 bilhões.
“Contrapartidas contábeis dos contratos de VPC artificialmente criados e lançamento incorreto dos juros sobre operações financeiras, ambos contabilizados na forma de lançamentos redutores da conta de fornecedores, totalizando os saldos de R$ 17,7 bilhões e R$ 3,6 bilhões, respectivamente”, explicou o comunicado.
Também foi encontrado a contratação de operações de financiamento de compras (risco sacado, forfait ou confirming) de R$ 18,4 bilhões e de capital de giro de R$ 2,2 bilhões, ambas inadequadamente contabilizadas na conta de fornecedores no balanço patrimonial da companhia.
Em relação ao impacto na rubrica de fornecedores, os efeitos praticamente se anularam, resultando numa redução líquida de apenas R$ 700 milhões em 30 de setembro de 2022 (combinação de lançamentos que incrementavam a conta de fornecedores de R$ 18,4 bilhões e R$ 2,2 bilhões e lançamentos que reduziam a conta de fornecedores de R$ 17,7 bilhões e de R$ 3,6 bilhões).
Sobre a alavancagem da Americanas em 30 de setembro de 2022, a incorreta contabilização das operações de financiamento de compras e de capital de giro minorou sua dívida financeira bruta em R$ 20,6 bilhões.
Por fim, o comunicado disse que os entendimentos preliminares e sujeitos a alterações, foram oriundos dos resultados dos trabalhos de refazimento das demonstrações financeiras históricas da companhia e do relatório apresentado por seus assessores.
Em CPI, atual CEO da cia descarta inconsistência contábil e reconhece fraude
O presidente da Americanas, Leonardo Coelho Pereira, reconheceu nesta terça-feira (13) que a crise na varejista não pode mais ser tratada como crise de inconsistências contábeis, e sim como fraude. Ele disse que chegou a essa conclusão ontem, após ter acesso a relatório de investigação independente sobre as finanças da companhia.
Essas evidências que me foram trazidas ontem não mais me permitem como CEO das Americanas tratar como inconsistência contábeis, reiterou o executivo em audiência pública na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga a fraude na Americanas.
Diante dos novos fatos, segundo ele, duas decisões foram tomadas pela direção da empresa. A primeira, de demitir 30 funcionários vinculados à fraude. A segunda, de compartilhar o relatório com autoridades envolvidas nas investigações, entre elas a CPI, o Ministério Público, Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a Polícia Federal.
Durante a reunião, ele divulgou as novas evidências que apontam para a fraude, entre elas duas planilhas com resultados da empresa de 2021 e projeções para 2022, as quais apresentavam resultados discrepantes para o mesmo período analisado.
Uma das planilhas, classificada de Visão Interna, apresentava prejuízos de R$ 733 milhões. A outra, classificada de Visão Conselho, apresentava lucro de R$ 2,9 bilhões. Essa última consistente com o resultado divulgado ao mercado.
Entre a visão interna e a visão conselho foram criados R$ 3,5 bilhões de resultado, observou o CEO. Ele, que tem experiência em restruturação financeira e operacional de varejistas, disse que o caso é uma fraude de resultados.
Pode-se criar lucro a partir de uma planilha, só que você não cria caixa a partir de uma planilha. Se a diretoria antiga da Americanas falsificou lucro, ela não consegue falsificar o caixa, então é preciso de um empréstimo bancário para colocar dinheiro naquela operação e a fraude não ficar transparente para ninguém, complementou o executivo.
Falsificação de resultados
O relator, deputado Carlos Chiodini (MDB-SC), frisou que com os resultados preliminares das investigações, o prejuízo financeiro da empresa saltou de R$ 20 bilhões, para o patamar dos R$ 40 bilhões. Diante disso, o parlamentar questionou sobre como operava o esquema de fraude na empresa.
Pereira explicou que esse tipo de fraude enfatiza a redução dos custos de mercadoria vendida, aumentando o lucro de forma artificial, com uma contrapartida na redução da conta de fornecedores.
Nesse ponto, o CEO apresentou aos deputados e-mails que constam do relatório de auditoria pelo qual a manipulação das informações com as operações de fornecedores era uma preocupação de vida ou morte para a diretoria antiga.
Ele referiu-se ao esforço da antiga diretoria por reajustar os valores nos contratos de venda de propaganda cooperada, ou VPC, um instrumento pelo qual a varejista vende ao fornecedor espaço na loja para a promoção do produto.
Por se tratar de uma fraude complexa, Pereira disse que esses resultados contábeis distorcidos não eram percebidos por analistas que não tinham acesso às contas da empresa.Por isso que nenhum investidor, nenhuma casa de financiamento no Brasil ou no exterior foi capaz de identificar essa fraude pela contabilidade, disse o CEO.
Demissões
Durante a audiência, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) falou de sua preocupação com demissões em massa e aumento de ações trabalhistas, sem que a empresa tenha caixa para fazer pagamentos na justiça.
“Aqui esteve um representante sindical indicando que há medidas no Ministério Público do Trabalho determinando guarda de recursos para dar causa à remuneração no caso de vitória desses trabalhadores”, observou o parlamentar.
Pereira informou que, neste ano, houve aumento de 100 reclamações trabalhistas, resultado em total de 900, o que é motivo de preocupação para a administração da empresa. Ele reforçou que objetivo natural é a manutenção de empregos que, segundo ele, não oscilou apesar da crise.
Em maio de 2022, a Americanas contava com 40.500 funcionários; um ano depois, empregava 40.300 funcionários. As cerca de 5 mil demissões, explicou o CEO, são típicas da sazonalidade das empresas de varejo.
Com informações são da Agência Câmara de Notícias.
Edição: Cynara Escobar / Agência CMA.