São Paulo – O Ministério da Saúde e a decisão de escolher um general para comandar a pasta em meio à pandemia de covid-19 será um dos elementos analisados pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigará os erros e omissões do governo no combate à doença, afirmou o relator da comissão, o senador Renan Calheiros (MDB-AL).
“Não estaremos, queria repetir, investigando nomes ou instituições, mas fatos e os responsáveis por eles. As gestões do Ministério da Saúde, evidentemente que podem ser apuradas investigadas a fundo. Ainda não é o caso”, disse ele durante um pronunciamento.
O comentário faz referência indireta às trocas de comando no Ministério da Saúde feitas pelo presidente Jair Bolsonaro durante a pandemia de covid-19, e em particular à nomeação de Eduardo Pazuello, um militar, para chefiar o órgão.
“Não é o exército brasileiro que estará sob análise, uma instituição permanente de estado. Imaginem um epidemiologista conduzindo tropas em Monte Castelo. Na pandemia o ministério foi entregue a um não especialista. O resultado fala por si só: no pior dia da covid, em apenas 4 horas o número de brasileiros mortos foi igual a todos que tombaram nos campos de batalha da segunda guerra mundial”, disse Renan Calheiros.
“O que teria acontecido se tivéssemos enviado infectologista para comandar tropas? Provavelmente um morticínio. Porque guerras se enfrentam com especialistas, sejam elas guerras bélicas ou guerras sanitárias. A diretriz é clara: militar nos quartéis e médicos na saúde. Quando se inverte, a morte é certa”, acrescentou.
As palavras do senador são um recado claro a Bolsonaro, que fez as trocas no Ministério da Saúde no ano passado por exigir que os responsáveis pela pasta naquele período – Henrique Mandetta, depois Nelson Teich e Pazuello em seguida – adotassem protocolos de tratamento e de prevenção que ele considerava corretos, mas que não eram amparados pela ciência.
O atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, é médico (assim como Mandetta e Teich), e profere um discurso muito mais alinhado com o da Organização Mundial da Saúde (OMS) que seu antecessor. Ele foi nomeado ministro no auge da pandemia de covid-19 no Brasil e diante da perspectiva de que o Senado poderia abrir uma CPI para investigar como o governo estava lidando com a pandemia.
TENTATIVA DE AFASTAMENTO
Calheiros também usou parte de seu discurso para criticar a iniciativa da ala bolsonarista do Congresso para tentar impedir sua nomeação como relator da CPI da covid-19 por via judicial. Antes da instalação da CPI, um juiz federal de primeira instância chegou a proferir decisão liminar a pedido da deputada Carla Zambelli (PSL-SP) para suspender eventual nomeação do senador para o posto. A decisão foi revertida na segunda instância.
“O negacionismo em relação à pandemia ainda terá que ser investigado e provado, mas o negacionismo em relação à CPI da covid já não resta a menor dúvida” de que existe, disse Renan.
LAVA JATO
Renan Calheiros também aproveitou o seu discurso para alfinetar a Lava Jato. Em determinado ponto do pronunciamento, disse que suas opiniões “serão subordinadas aos fatos” e que a CPI não será “um cadafalso com sentenças prefixadas ou alvos selecionados”.
“Não somos discípulos de Deltan Dallagnol nem de Sérgio Moro. Não arquitetaremos teses sem provas, ou powerpoints contra quem quer que seja. Não desenharemos o alvo para depois disparar flechas. Não reeditaremos a República do Galeão”, afirmou.
Deltan Dallagnol é o principal procurador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, e Sérgio Moro foi o juiz de primeira instância que emitiu as sentenças relacionadas à operação – entre elas as que resultaram na prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e que foram recentemente anuladas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).