São Paulo, 8 de agosto de 2023 – A ata da reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom/BC), realizada nos dias 1 e 2 de agosto, trouxe as explicações sobre a opção de corte de 0,50 ponto percentual e as justificativas dos membros que queriam um corte menor, de 0,25 ponto percentual. Para esse segundo grupo, “a própria sinalização do Comitê já enfatizava a cautela e a parcimônia em tal conjuntura e, na opinião desses membros, não se observaram alterações relevantes no cenário ou projeções do Comitê que justificassem uma reavaliação dessa sinalização”.
Já o outro grupo considerou que a postura de política monetária em patamar significativamente contracionista permite um início do ciclo já no ritmo moderado considerado para as próximas reuniões, sem detrimento do comprometimento com a meta e a credibilidade da política monetária. Esse grupo enfatizou alguns desenvolvimentos desde a última reunião, como a dinâmica recente de inflação mais benigna do que era esperado, a reancoragem parcial relativamente célere após a definição da meta pelo CMN e a adequação de recalibrar a taxa de juros real em função dos movimentos nas expectativas de inflação.
O Comitê unanimemente avaliou que a evolução do cenário desde a última reunião permitiu acumular a confiança necessária para iniciar um ciclo gradual de flexibilização monetária. Tal avaliação perpassou diferentes dimensões. Em primeiro lugar, ressaltou-se o comportamento positivo das expectativas de inflação após a definição da meta pelo CMN e o anúncio da mudança para o sistema de meta contínua. A redução das expectativas de inflação, assim como das medidas de inflação implícita nos ativos de mercado, reduz o custo da desinflação e tem impacto sobre o juro real ex ante da economia, como já anteriormente alertado pelo Copom. Em segundo lugar, houve clara melhora nos índices de inflação cheia, enquanto a inflação de serviços segue desacelerando na margem.
Alguns membros deram mais ênfase à dinâmica recente, enquanto outros enfatizaram que os fundamentos subjacentes para a dinâmica da inflação de serviços ainda não permitem extrapolar com convicção o comportamento benigno recente. Com relação ao hiato do produto, alguns membros notaram que sua estimativa tem sido revisada para cima e o Comitê discutiu as implicações de formas alternativas de mensuração de hiato com outros modelos e seus respectivos impactos nas projeções.
Por fim, notou-se que a reancoragem parcial das expectativas contribuiu para uma redução das projeções no cenário de referência. No entanto, a atualização de algumas variáveis do cenário de referência que afetam a estimativa e as projeções do hiato do produto compensaram esse movimento, fazendo com que as projeções de inflação não diferissem tanto em relação às da última reunião. Após a análise do cenário, todos os membros concordaram que era apropriado reduzir a taxa Selic nesta reunião.
Durante o debate, o Comitê julgou haver mérito tanto na opção de reduzir a taxa Selic em 0,25 ponto percentual como em 0,50 ponto percentual, reforçando que, qualquer que fosse a decisão, era consensual que um cenário com expectativas de inflação com reancoragem apenas parcial, núcleos de inflação ainda acima da meta, inflação de serviços acima do patamar compatível com a meta para a inflação e atividade econômica resiliente requer uma postura mais conservadora ao longo do ciclo de flexibilização da política monetária. Mais ainda, ambas as opções, a depender do ciclo empreendido, seriam compatíveis com a convergência da inflação para a meta tanto nos cenários de referência do Comitê, como em outros cenários apresentados na reunião.
Com relação aos próximos passos, os membros do Comitê concordaram unanimemente com a expectativa de cortes de 0,50 ponto percentual nas próximas reuniões e avaliaram que esse é o ritmo apropriado para manter a política monetária contracionista necessária para o processo desinflacionário. Tal ritmo conjuga, de um lado, o firme compromisso com a reancoragem de expectativas e a dinâmica desinflacionária e, de outro, o ajuste no nível de aperto monetário em termos reais diante da dinâmica mais benigna da inflação antecipada nas projeções do cenário de referência. Avaliou-se ainda que não há evidência de que esteja em curso um aperto além do que seria necessário para a convergência da inflação para a meta e que o cenário ainda inspira cautela, reforçando a visão de serenidade e moderação que o Comitê tem expressado. O Comitê julga como pouco provável uma intensificação adicional do ritmo de ajustes, já que isso exigiria surpresas positivas substanciais que elevassem ainda mais a confiança na dinâmica desinflacionária prospectiva.
Por fim, o Comitê debateu a extensão do ciclo de ajustes na política monetária. O Comitê analisou as projeções do cenário de referência, de um cenário com redução da taxa de juros em 0,50 ponto percentual nesta reunião e de cenários alternativos que refletiam o balanço de riscos. Evidenciou-se, nessa análise, a necessidade de se manter uma política monetária ainda contracionista pelo horizonte relevante para que se consolide a convergência da inflação para a meta e a ancoragem das expectativas. Enfatizou-se que a extensão do ciclo ao longo do tempo dependerá da evolução da dinâmica inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica, das expectativas de inflação, em particular as de maior prazo, de suas projeções de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos. “O Comitê mantém seu firme compromisso com a convergência da inflação para a meta no horizonte relevante e reforça que a extensão do ciclo refletirá o mandato legal do Banco Central”.
Indicadores
Segundo a ata, os dados relativos ao crescimento no Brasil seguem compatíveis com o cenário-base de moderação da atividade antecipado pelo Comitê. Nota-se que o processo de reequilíbrio da cesta de consumo, e consequentemente dos preços relativos, entre bens e serviços prossegue, com moderação no consumo de bens em prol de maior demanda no segmento de serviços. Entretanto, o setor de serviços tem apresentado acomodação nos últimos meses. Além disso, os dados mais tempestivos seguem sugerindo um ritmo de crescimento da economia em linha com o esperado pelo Comitê.
Novamente, debateram-se os desenvolvimentos no mercado de trabalho. Alguns membros seguem avaliando que há moderação recente no mercado de trabalho, apontando para a desaceleração no ritmo de contratação no mercado formal e para a queda na taxa de participação. Outros enfatizaram a queda na taxa de desemprego e o ritmo ainda elevado de contratações no emprego formal. O Comitê concordou que não há evidência de pressões salariais elevadas nas negociações trabalhistas. Alguns membros observaram que avança o movimento de recomposição parcial das perdas nos salários reais ocorridas anteriormente. Esse movimento é esperado e vem acompanhado de desaceleração nos ganhos nominais, o que deve se acentuar à frente.
As expectativas de inflação apresentaram reancoragem parcial desde a reunião anterior do Copom. O Comitê enfatizou o ganho de credibilidade produzido pela reunião de junho do Conselho Monetário Nacional (CMN), que estabeleceu a meta para a inflação no ano-calendário de 2026, bem como o seu intervalo de tolerância, nos mesmos valores dos vigentes para 2024 e 2025 e sem revisão das metas e dos intervalos anteriormente estabelecidos para os anos-calendário de 2023, 2024 e 2025. Além disso, o anúncio de que se adotará o sistema com meta contínua, cujas regras serão ainda oportunamente estabelecidas, reduziu a incerteza sobre as metas dos anos subsequentes, também contribuindo para maior reancoragem. Notou-se, por conseguinte, um impacto positivo nas expectativas de inflação logo após a decisão do CMN, reforçando a interpretação de ganho de credibilidade do regime de metas para a inflação.
O Comitê retirou de seu balanço de riscos a incerteza residual sobre a aprovação do arcabouço fiscal, mas, em sua discussão, notou que a dinâmica fiscal seguia sendo relevante em seu cenário-base. Em particular, alguns membros avaliaram que persiste alguma incerteza entre os agentes sobre a superação dos desafios fiscais, evidenciada nas expectativas de resultado primário que divergem das metas estabelecidas pelo governo, e que isso pode também estar se refletindo em expectativas de inflação desancoradas para prazos mais longos.
Nesse caso, a ancoragem das expectativas em torno das metas previstas no novo arcabouço fiscal, com a manutenção do compromisso fiscal externado, além de uma diminuição das incertezas acerca das medidas tributárias que fundamentam a execução de tal objetivo, contribuiria para um processo desinflacionário mais célere.
Outros avaliam que um cenário global de maior inflação também dificulta a reancoragem das expectativas, uma vez que há a possibilidade de uma inflação externa em níveis mais elevados por período prolongado. Por fim, mencionou-se a hipótese de percepção dos agentes de que, ao longo do tempo, o Banco Central poderia tornar-se mais leniente no combate à inflação. Foi unânime o entendimento de que, independentemente da composição da diretoria colegiada ao longo do tempo, deve-se garantir a credibilidade e a reputação da Instituição.
O Copom relembra que reformas estruturais e a previsibilidade das contas públicas são essenciais para o aumento da produtividade da economia, para o crescimento potencial e para a maior confiança de empresas, investidores e famílias. O esmorecimento no esforço de reformas estruturais, o aumento de crédito direcionado e as incertezas sobre a estabilização da dívida pública têm o potencial de elevar a taxa de juros neutra da economia, com impactos deletérios sobre a potência da política monetária e, consequentemente, sobre seu custo para a economia.
Dylan Della Pasqua / Agência CMA
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