São Paulo – Na abertura do evento, o ministro da economia, Paulo Guedes, reiterou que o governo está na fase final da capitalização da estatal. “Há urgência aparente em capitalização da Eletrobras, mas é discutido há muito tempo”, disse, destacando que o
Executivo discute o tema desde o início do atual governo. Ele também avalia que o processo é decisivo para segurança energética brasileira. “Estamos vendo energia mais cara e com instabilidade de preço”, disse.
Enquanto na primeira parte do evento ter um prazo maior foi apontado como importante para trazer mais segurança à capitalização da Eletrobras, no segundo painel do debate promovido pelo Tribunal de Contas da União (TCU), denominado “Visão do Mercado sobre a Capitalização da Eletrobras”, os especialistas do mercado destacaram a importância de realizar o processo o quanto antes, em maio, para levantar mais recursos para a companhia.
Para o diretor do UBS BB, Giuliano Ajeje, hoje a janela está aberta, o que significa finalizar a capitalização em 13 de maio. “O risco de postergar para o próximo semestre é o calendário eleitoral e aversão ao risco por conta dos impactos da guerra na Ucrânia e fazer uma capitalização com um investimento inferior, o que pode comprometer investimentos.”
O especialista disse que a Eletrobras é vista pelos investidores como uma empresa especulativa. A cada 1 real colocado na empresa se queima 0,90 centavos. Embora atualmente exista mais previsibilidade, ainda há dificuldade de prever a geração de caixa na Eletrobras, por isso, ela é especulativa, disse.
“Ao tornar-se uma corporation, a Eletrobras terá mais previsibilidade e atrairá investimentos, com fundos de infraestrutura. Não haverá investidores estratégicos, como foi falado erroneamente no painel anterior [mencionado por Nelson Hubner]. Eu tenho conversado com investidores de longo prazo muito interessados em aportar na Eletrobras. O risco de não realizar a capitalização é de a empresa deixar de existir”, comentou o executivo do UBS BB.
Para Fabiano Custódio, sócio da Miles Capital, hoje há uma demanda por ativos que protegem o investidor da inflação, por isso o estrangeiro está aportando no mercado brasileiro. “Acompanhando o setor de utilities há 20 anos, desconheço uma estatal que teve uma boa gestão. O investidor busca previsibilidade e todas as estatais listadas no Brasil tiveram períodos muito ruins. A alavancagem da Eletrobras chegou a 7,8 vezes, uma situação quase falimentar, não conseguiu publicar o formulario 8-F. Houve congelamento de
tarifas no Paraná (a energia é operada pela Copel). Então, imagino que a Eletrobras sendo operada por grandes fundos internacionias, isso vai melhorar. O governo continuará sendo dono da empresa, melhor gerida e com ações mais valorizadas”, analisou o analista.
Para o economista José Guimarães Monforte, a capitalização da Eletrobras é “inevitável”, considerando que ela recorreu muitas vezes ao Tesouro para se manter. Nesse sentido, o economista vê com urgência a necessidade de levar a companhia ao mercado considerando que o momento atual é o melhor para aportar a maior quantidade de recursos.
“Eu vi muitas capitalizações como banqueiro, já estive no conselho de administração da Sabesp, Petrobras e da Eletrobras, vi processo de destruição de valor da empresa, tive o desprazer de sentar no Departamento de Justiça norteamericano. É difícil competir com empresas de capital privado, a estatal sempre terá ônus de custos.”
Em sua avaliação, após a capitalização, a Eletrobras será beneficiada por melhoria no custo de capital e pela recuperação da capacidade de gerir pessoas, em um ambiente de empresa privada, o que pode melhorar sua competitividade. “Além disso, o aumento de liquidez traz melhor capacidade para o mercado também oferecer mais descontos a outros competidores, democratizando o capital”, acrescentou Monforte.
Bernardo Parnes, da Investment One Partners, citou a privatização da Vale como um exemplo de sucesso e defendeu a capitalização da Eletrobras como importante para o interesse do país. “Temos uma chance de mostrar para o mundo e ficar à frente de competidores internacionais na questão de segurança energética, o que deixa o timing mais importante para se considerar [e acelerar o processo de capitalização da Eletrobras]”, comentou.
Mauro Martinelli, do Sindicato dos Urbanitários de Brasília (STIU-DF) perguntou se o processo nao está sendo acelerado pelo governo sem promover as discussões com a sociedade adequadamente, o que foi contestado por José Guimarães Monforte, que avalia que a capitalização vem sendo discutida há seis anos, foi aprovada pelo Consgresso e trará benefícios para a sociedade ao melhorar a operação da empresa e reduzir seus custos, na sua avaliação.
MAIS TEMPO, MAIS SEGURANÇA
O presidente da Associação dos Investidores no Mercado de Capitais (Amec), Fábio Coelho, disse que, em relação ao prazo da oferta de capitalização da Eletrobras, atualmente sob escrutínio do Tribunal de Contas da União (TCU), o consenso do mercado vê diferenças entre ofertar a capitalização em maio ou agosto e considera que um prazo maior pode trazer mais segurança ao processo, na sua avaliação.
O comentário foi feito no painel “Visão do Modelo de Capitalização da Eletrobras”, o primeiro do evento o evento “Diálogo Público: Modelo de Capitalização da Eletrobras”, promovido pelo TCU nesta manhã.
Segundo Coelho, o mercado de capitias privilegia o modelo de “corporation” – semelhante ao desenhado para a capitalização da Eletrobras – por que ele verifica que pode acessar recursos imediatamente, no lançamento da oferta, e no futuro, a partir de novas oportunidades. Neste modelo, a limitação de voto dos acionistas refere-se ao direito de exercício. A União mantém seu direito e o capital da companhia fica diluído entre os demais acionistas. “Esse modelo destrava valor”, comentou.
Para o senador Jean Paul Prates (PT-RN), o processo deveria ser postergado para o próximo governo. “Nós optamos pelo sistema atual, não dá para mudar na canetada como o governo está querendo. Colocaram como prioridade a capitalização e tudo virou detalhe, se é importante para o interesse público, a participação de Itaipu. Temos que discutir, mas sem pressa, vamos esperar passar as eleições. Eletrobras e Petrobras são duas estatais bem sucedidas, bancaram políticas públicas importantes como o Luz Para Todos. Temos que fazer tudo correndo para agradar corretoras?”, comentou o senador, ao final do primeiro painel.
Para Rodrigo Ferreira, da Abraceel, a tarifa real das usinas Eletrobras está na casa de R$ 170,00, com custo de risco hidrológico de R$ 110,00, um valor “exorbitante”, na sua avaliação. “A transferência e a descotização da energia [previstos na modelagem da capitalização da Eletrobras] contribuirão para a modicidade tarifária e para a gestão do risco hidrológico”, opinou.
Segundo Ferreira, a Eletrobras faz parte de uma janela de oportunidades, com Itaipu e termelétricas, que compõem 21% do portfólio das distribuidoras, o que garatirá um novo mercado para as comercializadoras de energia.
Segundo estudo da Abraceel, a janela de oportunidades em que a estatal participa com 6,5 GW inclui uma projeção de R$ 210 bilhões de economia para o consumidor até 2035 para contratar energia por conta da descotização prevista na capitalização da empresa. “O modelo comercial precisa mudar e a Eletrobras é chave para que isso seja feito com segurança para o consumidor”, finalizou.
Para Nelson Hubner, especialista do setor elétrico e que é crítico da capitalização da Eletrobras, tornar a empresa sem as amarras de uma estatal pode ser benéfico, mas traz desafios para o seu controle. “Uma corporation não tem um acionista majoritário, mas tem um acionista de referência. Na Light, por exemplo, tinham três empresas muito fortes – como a Cemig – que atuavam quase como um acionista majoritário e acabava emperrando a gestão da empresa”, comentou.
Para Hubner, quem vai participar de fato da gestão são os grandes fundos de pensão e não as empresas brasileiras de energia, por que eles vão conseguir apropriar o investimento na Eletrobras em seus balanços, tampouco terão condições de direcionar os investimentos. “A gestão da empresa poderá ter problemas, em termos de direcionamento dos investimentos.”
O Brasil tem uma grande de capacidade de energia hídrica, nos EUA é só 7% e definida por cotas. “Eu acho que os órgãos do consumidor vão exigir o uso dessa capacidade.”
Nos EUA, toda a energia das usinas hídricas são vendidas para utilities públicas verticalizadas. Ele citou como exemplo a PGN, uma empresa mista dos EUA, faz leilão de preços de energia vendida para o dia seguinte e disse que o mercado é dominado por térmicas. As hídricas vendem sua energia ao preço da energia térmica. “A energia hídrica é usada para usinas incentivadas”.
Ricardo Brandão, da Abradee, destacou que o despacho físico, sem a energia de cotas da Eletrobras, ficará mais barato.
A capitalização da Eletrobras combinada com modelo computacional é melhor para a precificação da energia, na visão da Abraceeel. “Se não fosse a expansão pelo mercado livre, a indústria de eólica teria quebrado. A nacionalização foi relevante para manter essa indústria, mas a demanda foi viabilizada pelo mercado livre. Quem viabiliou essas usinas foi o preço de mercado do mercado livre”, afirmou Rodrigo Ferreira.