Nível de dívida é inviável para que Americanas possa prosseguir, diz ex-CEO Sergio Rial

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São Paulo – Em pronunciamento a investidores nesta manhã, o ex-CEO da Americanas Sergio Rial disse que o nível de endividamento da companhia é inviável para que possa prosseguir, mas que seus acionistas controladores estão comprometidos para que ela seja sanada. As declarações foram dadas após a companhia ter informado aos acionistas que encontrou inconsistências contábeis de R$ 20 bilhões em seus balanço na noite de ontem (11/01).

Segundo Rial, as inconsistências refletem ações de anos anteriores, não só de 2022, e que dependerão de validação contábil específica por seus auditores externos, a ser realizada pela PwC.”Por mais diligentes que tivéssemos sido, não conseguimos identificar os fatos que resultaram nas inconsistências no curto período desde que assumimos na empresa”, disse Rial, em pronunciamento, ao relatar o trabalho preliminar realizado por ele e pelo diretor de Relações com Investidores (RI) André Covre, que deixam a companhia 10 dias após assumirem sua gestão.

Nesta quinta-feira, o conselho da companhia decidiu instalar um comitê independente que terá entre suas atribuições a identificação e o entendimento de todos os lançamentos contábeis – que tem toda formatação de serem inconsistentes. Rial disse não ser capaz de identificar desde quando começaram as inconsistências.

“A empresa apresentava um nível de endividamento bruto (peço permissão para errar dependendo da data de corte) entre R$ 18 e 19 bilhões contra um caixa de R$ 8-9 bilhões. O caixa continuou nesse valor e a dívida bruta cresceu em 2022 – e eu não tive nenhuma implicação direta nele – por conta de um 3T22 muito atípico em relação ao 1T22 e ao 2T22, e um 4T22 que ainda não foi finalizado.”

O executivo também disse que maior consumo de capital de giro e investimento em capex, em torno de R$ 2,1 bilhões, contas grandes que impactaram o capital de giro da empresa.

Rial disse que a análise da conta risco sacado/fornecedor, que é a presença do banco na conta fornecedor da empresa e que em empresas com margens mais estreitas, pode induzir a dívida bancária, que passa ser caracterizada como conta fornecedor. “Percebemos que boa parte dessa conta fornecedor da Americanas era essencialmente, dívida bancária e, portanto, terá que ser recatalogada como tal, a ser chancelada pela auditoria externa.”

Além disso, os executivos entenderam que o valor de R$ 20 bilhões informado ontem é uma estimativa de diversos lançamentos contábeis que surgiram ao longo dos últimos anos (antes de 2019, ele não soube precisar), que estão no balanço.

O financiamento do risco sacado depende do incremento de vendas e de capital de giro, portanto, o montante pode variar de acordo com o desempenho dos negócios da companhia.

Rial disse que a PwC deverá solicitar a republicação dos balanços ou impairments, o que deverá impactar os resultados e o patrimônio líquido da companhia.

“Até onde visualizamos, a companhia tem uma dívida de bruta de R$30-35 bilhões e caixa de R$ 8-9 bilhões e um patrimônio líquido em torno de R$ 16 bilhões. Claramente, o que denota a necessidade de uma capitalização.”

O nível de dívida é inviável para que possa prosseguir e a capitalização deverá ocorrer, acrescentou. Ele disse que a companhia continuará vendendo mas que “muito terá acontecer a partir de agora em sua estrutura patrimonial”. Ele ressaltou que os valores apresentados não representam guidance.

“O tamanho do que tem que ser feito não é o que eu queria [ao assumir a empresa], disse, ao justificar sua demissão.

Só a auditoria externa poderá dizer se houve fraude – Rial

Em conferência a investidores realizada pelo BTG Pactual, o ex-CEO da Americanas Sergio Rial disse que as inconsistências encontradas nas demonstrações financeiras da varejista, apesar de desagradáveis, podem motivar o debate sobre o suporte às finanças do setor em geral e começar a falar mais de liquidez, nível de ações e do rigor em relação à contabilidade em negócios que têm margens muito estreitas.

Rial disse que só a auditoria externa poderá dizer se o que ocorreu foi uma “fraude”, em resposta a analista.

No entanto, ele disse que embora a gestão não seja “transparente”, a cultura da companhia não é “tóxica”. “Pode ter sido um erro, é claro, mas há empresas muito comprometidas na companhia e reinvestiram seus bônus em ações da empresa.”

“A parte mais difícil, de muitas, dos últimos nove dias foi dizer a cerca de 100 pessoas na companhia que todas as suas economias investidas em ações da Americanas, por em média, nos últimos 20 anos – e eu também tenho algumas – foi ver a expressão de dor profunda em seus rostos”, disse Rial aos analistas. “Então, eu não tenho a obrigação legal, mas tenho a obrigação moral de ajudá-los.”

Ele disse que, certamente, a capitalização necessária será de bilhões de reais, o que deve levar a resultados mais consistentes em termos de rentabilidade, e garantiu que os acionistas controladores estão comprometidos nisso e lembrou que, em 2020, a Americanas levantou R$ 8 bilhões em um follow-on, que foi acompanhado por seus acionistas de referência. “Haverá impacto no PL mas o importante agora é manter a empresa funcionando. Os acionistas controladores estarão comprometidos mas certamente essa capitalização não dependerá só deles”, explicou. “A empresa têm R$ 9 bilhões em caixa.”

A necessidade de injeção de capital será para honras as dívidas da companhia e deverá ser feita por meio de renegociação com bancos ou por uma reengenharia financeira.

Na sua avaliação, as inconsistências contábeis não comprometem a credibilidade dos seus investidores, mas que certamente houve erros. “Eu tenho muito orgulho de ter me assciado a gente desse calibre. O Brasil tá crowded com plataformas eletrônicas e o modelo híbrido [digital e físico] da Americana gera caixa.”

Ele disse que considera o varejo digital “muito rápido e furioso” e difícil de controlar e que se, por um lado, exponencia o crescimento de vendas, a complexidade de gestão de margens, estoques e logística atual traz uma noção mais restrita de multiplicação dos ganhos, o que o atraiu ao setor.

“Eu continuo achando que é uma vantagem”, comentou sobre essa característica do varejo eletrônico.

Ele acredita que a complexidade do segmento deve levar a uma consolidação e maior crescimento na oferta de serviços financeiros, citando a atuação da Americanas com a Ame como exemplo.

Ele avalia que a empresa vai precisar se capitalizar para enfrentar problema contábil, provavelmente por meio de um follow-on ou por meio de aportes de seus acionistas, e que não é possível estimar a necessidade de capital. Ninguém definiu o valor, até porque o número não foi auditado. Mas sabemos que não será uma capitalização de milhões, diz Rial.

Rial disse que “basicamente, estamos dizendo que a dívida da companhia é maior, e que os acionistas de referência já foram contatados, tendo mostrado comprometimento com a varejista.

A empresa tem entre seus acionistas controladores os empresários Jorge Paulo Lemman, Marcel Teles, Carlos Alberto Sicupira, além de gestoras como Mold Capital, com R$ 1,6 bilhão em patrimônio distribuído em três fundos (2,6% do capital total) e a asset do Bradesco, com 1,18% (10,6 milhões de ações).

Em sua composição acionária, a companhia informa a seguinte composição: Acionistas de referência, com 271.834.960 ações, o que representa 31,13% do capital total; Capital Group, com 89.434.021 ações (9,91%); TIAA Cref (54.574.009 ações, 6,05%), Blackrock (45.559.919 ações, 5,05%) e outros (440.849.359, 47,86%). Em 23 de dezembro de 2022, a companhia tinha 902.252.268 ações em circulação no mercado.

AÇÃO DESPENCA

A Bolsa levou a ação da Americanas (AMER3) à leilão por volta das 13h (horário de Brasília), em atendimento ao artigo 9 da instrução CVM 168 – que permite que o gerente do pregão poderá determinar que uma operação seja submetida a prévio leilão, quando, a seu critério, o tamanho do lote a ser negociado exceda a quantidade considerada normal ou para assegurar a continuidade dos preços. Os papéis de Via e Magazine Luiza também passaram a ia a leilão por mostrar forte queda.

Nesta manhã, o papel da Americanas teve a negociação cancelada na B3, após ir a leilão com preço de R$ 3, o que representa uma queda de 75% em relação ao fechamento da véspera. A B3 liberou um limite de baixa para os ativos de 75% para 99% na sessão desta quinta-feira.

Às 11h45 (horário de Brasília), os papeís da Via (VIIA3), Magazine Luiza (MGLU3) e Méliuz (CASH3) estavam entre as piores quedas do Ibovespa, de 10,38%, 8,91% e 7,50%, respectivamente.

O movimento reflete a identificação, informada na noite de ontem, de inconsistências contábeis no valor de R$ 20 bilhões, que levaram à saída do presidente da empresa, Sergio Rial, e do diretor de relações com investidores, André Covre, de seus cargos depois de apenas 10 dias da posse.

O valor da inconsistência supera o valor de mercado da varejista, que até ontem era de R$ 10,8 bilhões (US$ 2,1 bilhões).

Ele disse que João Guerra não estava atrelado à presidência executiva, mas tem um histórico na empresa e terá a incumbência de gerir a companhia no dia a dia.

A Americanas informou, na noite de ontem (11/01), que detectou inconsistências contábeis no valor de R$ 20 bilhões, que levaram à saída do presidente da empresa, Sergio Rial, e do diretor de relações com investidores, André Covre, de seus cargos depois de apenas 10 dias da posse. O valor da inconsistência supera o valor de mercado da varejista, que até ontem era de R$ 10,8 bilhões (US$ 2,1 bilhões).

No fato relevante divulgado ontem, a empresa informou que Rial atuará ainda como assessor, apoiando os acionistas de referência da companhia no processo de apuração do ocorrido.

O executivo disse que apoiará a empresa na transição e que espera que os bancos a apoiem confiando em seus desempenho operacional bem sucedido nos últimos anos.

Os investidores ficam atentos ao possível contágio da notícia para as demais empresas e ao mercado de auditoria, se a empresa vai suportar a forte queda dos papéis na Bolsa.

(O texto foi atualizado em 16 de janeiro, às 11h30. Correção: ao contrário do informado anteriormente, a gestora Bogari Capital não detém nenhuma ação da Americanas desde outubro/2022.)