Brasília – O projeto de lei que prevê novas regras sobre o direito de preferência da Petrobras em leilões de partilha de produção ficará em segundo plano no Congresso, ofuscado por outros itens da pauta econômica do governo, embora esteja lentamente conseguindo apoio no Senado, onde está sendo debatido neste momento.
Sob a legislação atual, a Petrobras tem direito a exercer direito de preferência para adquirir uma fatia de 30% em qualquer bloco ofertado em leilões de petróleo da modalidade de partilha de produção – aquela em que o governo fica com uma parte do que é extraído das jazidas.
Esse direito, porém, tem sido alvo de críticas – entre elas a de que esta vantagem conferida à Petrobras prejudica os resultados das ofertas de campos de petróleo feitas pelo governo e a de que a estatal abusa deste direito em detrimento do governo.
Entre as propostas que circulam no Congresso para alterar este regime, a que mais avançou até o momento é o Projeto de Lei 3.178/2019, de autoria do senador José Serra (PSDB-SP).
O texto, apresentado em maio do ano passado, previa originalmente o fim da preferência da Petrobras nos leilões de partilha de produção e autorizava o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) a decidir o melhor regime jurídico de exploração e produção de petróleo e gás natural a ser adotado nos leilões do pré-sal.
Hoje a regra para estas áreas é adotar apenas o sistema da partilha de produção, sem possibilidade de os certames ocorrerem no sistema de concessão.
Serra é um dos que veem indícios de abuso da Petrobras no exercício do direito de preferência, e deixa isto explícito no projeto de lei, citando como exemplo o leilão do bloco de Três Marias, na quarta rodada de partilha de produção do pré-sal.
“Na condição de operadora de um consórcio, a Petrobras ofertou 18% de excedente em óleo para a União. Essa proposta foi derrotada por outro consórcio, com a oferta de 49,95%”, disse Serra, acrescentando, porém, que a estatal exerceu o direito de preferência e aderiu ao consórcio vencedor.
“O fato de a Petrobras aderir ao consórcio vencedor significa que a empresa espera ter lucro mesmo repassando 49,95% de excedente em óleo para a União. Contudo, isso não impediu a estatal de apresentar uma proposta tão baixa quanto 18%”, afirmou.
A matéria já tem parecer favorável na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, mas aguarda o relatório do senador e líder do DEM na Casa, Rodrigo Pacheco, para ser incluído na pauta da Comissão de Serviços e de Infraestrutura (CI) para ser votado. Uma primeira versão deste parecer foi apresentada em outubro do ano passado, mas desde então a matéria voltou para as mãos do relator para reexame.
O motivo para isso é que ainda falta unidade no Senado em torno da matéria, principalmente por parte do governo, que cobra segurança jurídica sobre o assunto e quer rentabilidade nos próximos leilões. Além disso, o Planalto considera o tema como sendo de segundo plano no cenário atual.
“Se a tramitação da matéria entregar à população brasileira uma legislação que dê mais agilidade, segurança jurídica e segurança de transparência a chance de passar é grande”, diz o líder do governo na Casa, senador Eduardo Gomes (MDB-TO).
Ele avalia que o texto não entra como prioridade na agenda governamental de hoje. “Temos hoje uma pauta econômica muito forte que influencia sobre as outras. Então toda matéria que verse sobre questões do governo e que possam ter algum reflexo no pacto federativo, na PEC emergencial, na administrativa, ou na tributária, principalmente, acho que fica em segundo plano porque essas são matérias de eixo sobre as quais o Congresso deve se debruçar”, disse.
EMENDA PARA UM CONSENSO
Para chegar a um consenso entre os senadores, Serra apresentou no início de fevereiro uma emenda ao seu próprio texto. O acréscimo, segundo ele, mantém o direito de preferência da Petrobras, mas obriga a estatal a apresentar uma oferta se tiver exercido o direito. Caso contrário a companhia pagaria uma multa no valor do bônus de assinatura do bloco leiloado.
Serra cita o contexto que motivou a criação da emenda apresentada posteriormente: “entende-se que uma prolongada discussão legislativa no Congresso, capaz de afetar os próximos leilões de partilha de produção, traria um prejuízo ainda maior do que o provocado pelo direito de preferência”, disse.
O senador afirma que a emenda tem como objetivo maior celeridade na formação de um consenso sobre o direito de preferência dentro do parlamento.
“Na proposta, a prerrogativa da Petrobras é mantida. Porém, a estatal, uma vez exercido o direito de preferência em um determinado bloco, é obrigada a apresentar oferta por ele. Caso contrário, pagará uma multa no valor do bônus de assinatura do referido bloco”, afirmou.
Ele diz que com isso a emenda corrige uma lacuna relevante na regulamentação do direito de preferência da Petrobras “que, ao fim e ao cabo, permitiu que a estatal agisse de forma divergente da que pretendiam os legisladores ao criar essa prerrogativa”.
A matéria no momento é vista como positiva por parte dos membros da CI e, segundo uma pessoa com conhecimento do assuntou ouvida pela Agência CMA, recebeu terá o apoio do MDB – partido que detém a maior bancada no Senado e possui quatro dos 23 membros titulares da comissão.
Segundo a fonte, o MDB apoia o texto por entender que o direito de preferência da Petrobras é importante, mas pode ser aprimorado para evitar o que aconteceu no leilão da cessão onerosa em novembro do ano passado.
O caminho até um consenso geral no Congresso é mais turbulento, principalmente se for mantida a versão original do texto, que remove o direito de preferência da Petrobras nos leilões.
O senador e líder da oposição no Senado Federal, Randolphe Rodrigues (Rede-AP), afirma que a solução para chegar a um acordo em torno do texto não seria por meio de termos que extinguem o direito de preferência da Petrobras.
Segundo ele, há a necessidade “de uma estratégia diferente dentro do tema e não se faz isso retirando a preferência da Petrobras”, disse.
Na Câmara, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que até recentemente liderava a minoria na Câmara dos Deputados, tem opinião semelhante. “As empresas estrangeiras terão a mesma igualdade de condições da estatal brasileira na hora de disputar leilões do pré-sal no modelo de partilha, o que é inadmissível. Petróleo tem que fazer parte da política energética estratégica do país”, afirmou. Segundo ela, a oposição da Câmara não cogita remover o direito de preferência da Petrobras e não vê hipótese de acordo em relação ao tema.
Edição: Gustavo Nicoletta (g.nicoletta@cma.com.br)