São Paulo – O Ibovespa fechou em queda pelo terceiro pregão seguido, com perdas de 7%, aos 105.718,29 pontos, em um forte movimento de correção depois do Carnaval, já que nos últimos dias cresceram os temores de que o coronavírus se espalhe em mais países, podendo se transformar em uma pandemia. Também agravou o nervosismo dos investidores a confirmação do primeiro caso da doença no Brasil.
Com isso, o índice fechou na maior queda percentual desde o “Joesley Day”, no dia 18 de maio de 2017, quando o Ibovespa recuou 8,80% (61.597,05 pontos) refletindo a notícia de que o empresário Joesley Batista, um dos donos da JBS, faria uma delação premiada depois de gravar uma conversa com ex-presidente Michel Temer. O índice ainda encerrou no menor patamar em mais de três meses, desde o dia 20 de novembro de 2019 (105.864,18 pontos). O volume total negociado hoje foi de R$ 32,7 bilhões, considerado elevado por analistas.
No fim do pregão, o Ibovespa acelerou perdas acompanhando a virada para a queda de índices norte-americanos, que reagiram a uma notícia da agência de notícias “Bloomberg”, segundo a qual um funcionário da Administração de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos (FDA, na sigla em inglês) – correspondente à Anvisa no Brasil – indicou que o novo coronavírus está a beira de se tornar uma pandemia.
Para o sócio da RJI Gestão e Investimentos, Rafael Weber, caso se confirmasse a transformação do surto em uma pandemia haveria uma “situação nova”, com investidores passando a exigir ainda mais prêmio de risco e mais correções nos mercados.
Porém, acredita que a queda de hoje do Ibovespa já espera esperada e está em linhas com as perdas das american depositary receipts (ADRs, recibos de ação de empresas estrangeiras negociados na Bolsa de Valores de Nova York) brasileiras nos últimos pregões, além disso, acredita que será importante observar se os casos na China irão diminuir e se os bancos centrais mundiais continuarão a anunciar estímulos para conter impactos econômicos.
O diretor de investimentos da SRM Asset, Vicente Matheus Zuffo, lembra que no Brasil, por exemplo, o Banco Central (BC) se antecipou ao anunciar leilões de swap cambial antes da abertura do pregão, o que, no entanto, não impediu que a moeda superasse sua máxima histórica.
Zuffo ainda lembra que investidores devem acompanhar a coletiva de imprensa do presidente norte-americano, Donald Trump, hoje à noite, na expectativa que ele tente diminuir o nervosismo em relação ao coronavírus. “O Trump pode tentar tranquilizar os mercados, mas não sei se vai ser suficiente”, disse, completando que a volatilidade deve permanecer no curto prazo nos mercados.
O número de novos casos de coronavírus (Covid-19) fora da China superou os casos no país asiático pela primeira vez desde que o surto foi detectado no final do ano passado na cidade de Wuhan, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS). Segundo o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, agora existem 2.790 casos em 37 países, incluindo 44 mortes.
No Brasil, o primeiro caso foi confirmado hoje pelo Ministério da Saúde, que acrescentou que o governo está mapeando as pessoas que tiveram contato com o paciente contaminado para tentar restringir a disseminação da doença. Na China, o número de mortos subiu para 2.715, com 78.064 casos foram confirmados em 31 províncias chinesas, e há 2.491 casos suspeitos.
Entre as maiores quedas do índice ficaram as ações do setor de aviação, um dos mais prejudicados desde o início do surto, com voos paralisados, caso da Gol (GOLL4 -14,31%) e da Azul (AZUL4 -13,17%). Em seguida, apareceram as ações ligadas a commodities e a demanda chinesa, como da CSN (CSNA3 -10,96%), Gerdau Metalúrgica (GOAU4 -11,89%), além da Vale (VALE3 -9,53%) e da Petrobras (PETR4 -10,05%). Nenhuma ação que compõe o Ibovespa fechou em alta.
Na agenda de indicadores de amanhã, o destaque será a segunda leitura do PIB dos Estados Unidos do quarto trimestre de 2019, além de investidores devem continuar acompanhando os casos de coronavírus.
O dólar comercial fechou em forte alta de 1,16% no mercado à vista, cotado a R$ 4,4450 para venda, renovando a máxima histórica de fechamento pelo quinto pregão seguido, em sessão curta após o feriado prolongado. Além do ajuste do mercado doméstico na volta do Carnaval, o temor global com o coronavírus manteve o ambiente de aversão ao risco. Mesmo com a intervenção do Banco Central (BC), a moeda chegou a buscar o patamar inédito de R$ 4,45.
O gerente de mesa de câmbio da Correparti, Guilherme Esquelbek, ressalta o movimento de ajuste aos dois dias em que o mercado doméstico ficou fechado enquanto o cenário externo reagia ao estresse nos ativos globais devido a disseminação do coronavírus em vários países fora da Ásia, principalmente, na Europa. Ao redor de 40 países já confirmaram casos da doença, incluindo o Brasil, no qual o primeiro caso foi confirmado no fim da manhã.
“Além de acompanhar o exterior, aqui também repercutiu negativamente o vídeo do presidente Jair Bolsonaro convocando manifestações contra o Congresso Nacional, o que poderá atrasar a agenda de reformas”, comenta Esquelbek.
A fim de conter uma euforia na abertura dos negócios, no qual o dólar poderia ter se aproximado dos R$ 4,45 às 13 horas – quando o mercado local iniciou as operações – segundo o operador de mesa de uma corretora local, o BC anunciou antes a operação de swap cambial tradicional – equivalente à venda de dólares no mercado futuro – colocando no mercado US$ 500,0 milhões no início da tarde e fará outra operação amanhã, logo após a abertura com um montante de até US$ 1,0 bilhão.
“Ainda assim não impediu que o real fosse a moeda [de país] emergente que mais sofreu no dia de hoje”, acrescentou o profissional da Correparti.
Amanhã, na agenda de indicadores, o destaque fica para a segunda leitura do Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos no quarto trimestre de 2019. Porém, o diretor da corretora Mirae Asset, Pablo Spyer, pondera que o foco do mercado continuará nos desdobramentos do coronavírus. Além dos outros países, o Brasil monitora 20 casos suspeitos. “Mesmo com a ação do BC amanhã, o dólar tem respaldo para romper o nível de R$ 4,45”, avalia.