Política interna e covid de Trump fazem Bolsa cair e dólar subir

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São Paulo – O Ibovespa acelerou perdas perto do fechamento do pregão e encerrou em queda de 1,53%, aos 94.015,68 pontos, em meio a incertezas no cenário eleitoral nos Estados Unidos, depois que presidente Donald Trump contraiu coronavírus, e com novos ruídos políticos na cena doméstica. Rumores de que o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, criticou publicamente o ministro da Economia, Paulo Guedes, evidenciam que ainda há um embate dentro do governo sobre como financiar o programa Renda Cidadã.

Mais cedo, o índice chegou a operar em alta puxado por ações de bancos, mas não resistiu. O volume total negociado foi de R$ 24,1 bilhões. Com a queda de hoje, o Ibovespa recuou 3,08% na semana, engatando a quinta semana seguida de perdas.

“Não é de hoje que a relação entre Marinho e Guedes é problemática e, enquanto o governo não mostrar como vai fazer o Renda Cidadã funcionar, o sinal de alerta ficará ligado. Mas a queda de hoje do Ibovespa se deve principalmente ao cenário externo, já que Trump ficará pelo menos 15 dias de quarentena”, acredita o sócio e head de produtos da Monte Bravo Investimentos, Rodrigo Franchini.

Trump confirmou que está com covid-19, o que o deixará em quarenta na reta final da campanha eleitoral presidencial e levantou uma série de especulações, até de adiamento das eleições. O diagnóstico de Trump também ocorre em momento em que ele aparece atrás do democrata Joe Biden em pesquisas e durante o impasse sobre o novo pacote de ajuda fiscal.

Um pacote de estímulos foi aprovado pela Câmara norte-americana, mas mesmo sem acordo entre democratas e republicanos, que podem mudar a proposta no Senado. Além disso, indicadores divulgados mais cedo, como a criação de vagas de trabalho em setembro, vieram abaixo do previsto pelo mercado, motivos que levaram à quedas das Bolsas norte-americanas.

Já na cena doméstica, segundo agentes do mercado, pessoas que estiveram em uma reunião entre o ministro do Desenvolvimento Regional e investidores disseram que Marinho criticou duramente Guedes. O ministro da Economia é acusado de ter sido um dos que propôs a ideia de usar recursos de precatórios para custear o Renda Cidadã, mas depois criticar abertamente a proposta, que foi muito mal recebida pelo mercado nesta semana.

Em nota, porém, Marinho disse que as informações chegaram de maneira distorcida à imprensa. Por sua vez, Guedes disse, há pouco, que não acredita que o ministro tenha falado nada, mas que se falou é “despreparado, desleal e um fura teto”, mantendo ruídos no horizonte.

Para um analista de uma corretora nacional, há todos os indícios de que “o embate segue forte dentro do governo” principalmente em torno do Renda Cidadã, com direito a novos bate-bocas públicos, que ajudam a elevar a volatilidade do índice.

Entre as ações, as maiores quedas foram da Azul (AZUL4 -5,56%), da CVC (CVCB3 -5,47%) e do Magazine Luiza (MGLU3 -4,24%). Os papés da Petrobras (PETR3 -4,18%; PETR4 -4,23%) também ficaram entre as maiores perdas em meio a forte desvalorização dos preços do petróleo hoje. Na contramão, as únicas altas do Ibovespa foram do Santander (SANB11 1,57%), do Bradesco (BBDC4 0,41%) e da CSN (CSAN3 1,45%).

Na segunda-feira, investidores devem ficar atentos a indicadores do setor de serviços nos Estados Unidos e na eurozona, mas o foco deve ficar principalmente no cenário eleitoral norte-americano e na cena política local. “Foi mais uma semana de volatilidade e não tem nada que aponte um cenário mais calmo por enquanto”, disse a economista-chefe da Reag Investimentos, Simone Pasionotto.

O dólar comercial fechou em alta de 0,17% no mercado à vista, cotado a R$ 5,6630 para venda, em mais uma sessão de forte volatilidade da moeda com investidores digerindo a notícia de que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, testou positivo para a covid-19, enquanto aqui, ruídos políticos em torno do ministro da Economia, Paulo Guedes, voltaram a fazer preço. Com isso, a moeda fechou a semana com valorização de 1,93%, engatando a quarta alta semanal seguida.

No início da tarde, circulou entre as mesas de operações relatos de que o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, teria criticado o ministro Paulo Guedes durante uma reunião entre representantes da equipe econômica e investidores. Analistas avaliaram as falas como uma “fritura” de Guedes.

“Marinho teria assegurado a interlocutores que o [programa] Renda Cidadã sairá por bem ou por mal. Além de que o governo federal está tentando fazer da melhor forma possível, tentando manter o teto, mas há pressão para flexibilização, citando renúncias fiscais e a tentativa de chegar a um resultado neutro”, comenta o diretor da Correparti, Ricardo Gomes.

Gomes avalia que o mercado interpretou a fala de Marinho como indícios de que “a CPMF [Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira] ou algo do gênero é uma realidade”.

Por meio de nota, o ministério do Desenvolvimento Regional disse que informações chegaram à imprensa de maneira distorcida. “A reunião teve o intuito de reforçar o compromisso do governo com a austeridade nos gastos e a política fiscal. Não foram feitas desqualificações ou adjetivações de qualquer natureza contra agentes públicos, nem tampouco às propostas já apresentadas”, disse Marinho assinando o comunicado.

“Não acredito que ele tenha falado mal de mim, mas se falou ele é despreparado, desleal e um fura teto”, declarou Guedes há pouco sobre o evento. Em meio às declarações, o contrato futuro para novembro disparou e rondou os R$ 5,70.

Lá fora, o dólar perdeu terreno em meio aos dados do relatório de emprego, payroll, dos Estados Unidos mais fraco em setembro e com a notícia de que Trump está com coronavírus, o que levou investidores a alimentar dúvidas sobre a realização das eleições em 3 de novembro.

“Além de incertezas em torno do pacote de auxílio fiscal de US$ 2,2 trilhões e com o impacto da contaminação de Trump perto das eleições, o que se assistiu foi uma fuga em massa dos ativos de risco para ativos mais seguros”, acrescenta Gomes.

Na semana que vem, o cenário fiscal e político segue no radar dos investidores domésticos, enquanto o mercado global acompanha o estado de saúde do presidente dos Estados Unidos.

Na agenda de indicadores, o destaque fica para os dados de atividade do setor de serviços na Europa, enquanto a China seguirá com os negócios fechados até o fim da semana em razão de um feriado no país. Tem ainda a ata da última reunião do banco central norte-americano, o Federal Reserve (Fed).

“Fatores de influência no mercado global continuarão sendo a eventual aprovação de um novo programa de estímulo norte-americano e notificações sobre o avanço do covid-19 no mundo”, diz o analista da corretora Mirae Asset, Pedro Galdi.

As taxas dos contratos de juros futuros (DIs) encerraram a sessão em alta acelerada, após iniciarem o dia sem direção definida. O movimento de colocação de prêmios ganhou força após ruídos políticos envolvendo o ministro da Economia, Paulo Guedes. Declarações da véspera do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, também pressionaram a curva a termo, relegando o intenso noticiário desta sexta-feira.

Ao final da sessão regular, o DI para janeiro de 2022 ficou com taxa de 3,40%, de 3,12% no ajuste anterior; o DI para janeiro de 2023 terminou projetando taxa de 4,85%, de 4,61% após o ajuste ontem; o DI para janeiro de 2025 encerrou em 6,71%, de 6,53%; e o DI para janeiro de 2027 tinha taxa de 7,60%, de 7,50%, na mesma comparação.

Os principais índices do mercado de ações norte-americano fecharam em queda pressionados pela incerteza que a notícia de que o presidente Donald Trump testou positivo para a covid-19 trouxe para o cenário político dos Estados Unidos. As perdas, no entanto, foram reduzidas depois que a presidente da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos, Nancy Pelosi, sinalizou ajuda ao setor aéreo do país mesmo que um acordo de estímulos não seja alcançado com a Casa Branca.

Confira a variação e a pontuação dos índices de ações dos Estados Unidos no fechamento:

Dow Jones: -0,48%, 27.682,81 pontos

Nasdaq Composto: -2,22%, 11.075,01 pontos

S&P 500: -0,95%, 3.348,42 pontos