Puxado pelo mercado externo, Bolsa cai e dólar sobe

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São Paulo – O Ibovespa fechou em queda pelo segundo dia seguido, com perdas de 2,81%, aos 70.966,70 pontos, com o primeiro pregão de abril mostrando uma volta de maior aversão ao risco nos mercados em meio ao aumento de casos de coronavírus em vários países. O destaque é os Estados Unidos, o primeiro país a superar os 200 mil casos. Ontem à noite, o presidente norte-americano, Donald Trump, já havia alertado que a população deve se preparar para as próximas duas semanas, que serão muito dolorosas.

No entanto, ações ligadas a commodities, como as de frigoríficos, da Petrobras e da Vale, mostraram uma melhora ao longo do pregão, impedindo que o índice caísse ainda mais e acompanhasse as perdas mais acentuadas das Bolsas nos Estados Unidos. O volume total negociado hoje foi de R$ 21,7 bilhões.

“O Trump deu um sinal negativo e o mercado ainda está muito sensível, apesar de a pressão de venda ter diminuído nos últimos dias. A volatilidade ainda deve continuar”, disse o economista-chefe da Codepe Corretora, José Costa.

Ontem à noite, Trump se mostrou mais preocupado, sinalizando que o número de casos e mortes deve aumentar no país nos próximos dias. Os Estados Unidos quebraram um novo recorde com relação ao número de casos do novo coronavírus no país: agora são mais de 200 mil infectados pela doença, com mais de 4 mil mortes, de acordo com a atualização da contagem da Universidade Johns Hopkins

Entre as ações, as maiores quedas do Ibovespa voltaram a ser de ações dos setores de aviação e turismo, fortemente impactado pelo vírus, caso da Azul (AZUL4 -15,38%), da Gol (GOLL4 -10,50%) e da CVC (CVCB3 -14,86%), além dos papéis da Via Varejo (VVAR3 -11,36%).

Por outro lado, os papéis da Petrobras (PETR3 0,99%; PETR4 2,35%), que caíam mais cedo, passaram a subir em meio a notícias de que Trump irá se reunir com presidentes de empresas de petróleo no país para discutir uma ajuda ao setor. Mais cedo, a estatal apesar anunciou medidas adicionais em função de impactos da pandemia, reduzindo novamente sua produção de petróleo. Outras ações ligadas a commodities também avançaram, caso da Vale (VALE3 0,60%), que tem mostrado melhora com a estabilização de casos na China.

As maiores altas do Ibovespa, por sua vez, foram de ações de frigoríficos, como JBS (JBSS3 6,68%), Marfrig (MRFG3 4,29%) e BRF (BRFS3 3,51%), além da Telefônica Brasil (VIVT4 3,54%) e Suzano (SUZB3 4,21%).

Mais cedo, a BRF disse que, até o momento, não sentiu impacto em suas vendas devido às restrições ao funcionamento do comércio. No entanto, contratou linhas de financiamento junto a instituições financeiras brasileiras no valor total de R$ 1,4 bilhão pelo prazo de um ano, que tem o objetivo reforçar o seu nível de liquidez durante esse período de grande volatilidade.

Amanhã, além de continuar a acompanhar o número de casos e noticiário em torno do coronavírus, investidores devem observar, na agenda de indicadores, dados como os pedidos de seguro-desemprego e encomendas às fábricas nos Estados Unidos.

O dólar comercial fechou em alta de 1,23% no mercado à vista, cotado a R$ 5,2630 para venda, e renovou a máxima histórica de fechamento de 18 de março – quando a moeda encerrou a R$ 5,2010 para venda – além de engatar a quarta alta seguida em meio à forte aversão ao risco que prevalece no exterior com a perspectiva cada vez mais negativa sobre o crescimento da economia global.

“Não há como mitigar os efeitos e consequências danosas do novo coronavírus diante do cenário sombrio pelo qual as economias mundiais passam neste momento, e também pela absoluta falta de previsibilidade para o futuro”, avalia o diretor da Correparti, Ricardo Gomes.

Em sessão marcada por máximas históricas no qual a moeda chegou a R$ 5,2750, renovando o recorde intraday de 18 de março quando alcançou R$ 5,2570, o Banco Central (BC) atuou pelo quarto pregão seguido com venda de dólares no mercado à vista. “Nem mesmo a atuação do BC, vendendo US$ 645,0 milhões no mercado à vista, foi capaz de conter o avanço da moeda estrangeira”, acrescenta Gomes.

Com a piora no cenário da economia e o fortalecimento do dólar frente a todas as moedas globais, a autoridade monetária atuou de forma mais agressiva em março na tentativa de fornecer liquidez, o que não inibiu a escalada da divisa, usando quase US$ 25,0 bilhões das reservas cambiais do país. O saldo chegou ao pico de US$ 367,5 bilhões em 9 de março, mas fechou o mês com US$ 343,1 bilhões, no menor patamar desde julho de 2011.

O economista-chefe da Necton Corretora, André Perfeito, ressalta que as reservas caíram 12% desde que atingiram o volume histórico de US$ 390,5 bilhões em junho do ano passado, queda de mais de US$ 47,0 bilhões.

“As ações reiteradas da autoridade monetária em diminuir a volatilidade do real frente ao dólar já usaram 12% das reservas. Sabemos que a atuação do BC tem efeito discreto na moeda estrangeira e mesmo a operação de swap fornecido pelo Fed [Federal Reserve, o banco central norte-americano] de US$ 60 bilhões tem efeito relativo, já que se o mercado quiser levar o dólar para cima, ele vai levar”, avalia.

Para Perfeito, no curto prazo, a moeda norte-americana pode ir a R$ 5,50. “E pode ir mesmo para esse valor uma vez que funciona como um escape do mercado de juros que está anestesiado com a recente liberação de liquidez feita pelo BC de aproximadamente R$ 1,2 trilhões”, pondera. O economista da Guide Investimentos, Victor Beyruti, endossa que a moeda deverá subir mais nas próximas semanas sem perspectivas de melhoras em relação ao cenário do coronavírus.

“Os números que sairão até sexta e nos próximos dias nas economias globais vão começar a mostrar de fato os efeitos do vírus nas economias. Os PMIs que saíram hoje ainda não mostraram a realidade dos países que implementaram o isolamento social nas últimas semanas. A pressão altista vai continuar”, diz Beyruti.